Doppler venoso dos membros inferiores: implementação de novos conceitos e terminologia anatômica

O Fleury Medicina e Saúde, preocupado com a qualidade e confiabilidade de seus exames, criou um grupo especializado em exames vasculares.

O Fleury Medicina e Saúde, preocupado com a qualidade e confiabilidade de seus exames, criou um grupo especializado em exames vasculares. Com o intuito de padronizar e aperfeiçoar os exames de Doppler venoso dos membros inferiores o grupo, formado por médicos radiologistas especializados e com ampla experiência, realizou uma extensa revisão e atualização do assunto. Com base em consulta informal a cirurgiões vasculares com grande expertise no assunto e extensa revisão bibliográfica, foram realizadas alterações nos laudos e em alguns parâmetros relacionados à incompetência valvar e à terminologia anatômica utilizada.

Parâmetros de incompetência valvar

Os principais conceitos fisiológicos relacionados ao Doppler baseiam-se nos estudos de Van Bemellen et all (1,2) realizados no final da década de 80, cujos trabalhos embasaram os parâmetros utilizados até os dias de hoje. De acordo com esse autor consideravam-se incompetentes as veias superficiais e profundas que apresentavam refluxo acima de 0,5 s. As veias perfurantes não foram estudadas, porém por equivalência foram considerados os mesmos valores. Outro aspecto analisado foi a importância de velocidades acima de 30 cm/s para o adequado fechamento valvar.

Inúmeros trabalhos posteriores comprovaram ou desmentiram alguns desses achados, com destaque para o estudo de Labropoulos et all (3), realizado com o maior número de segmentos venosos, incluídas as veias perfurantes. Esse autor chegou à conclusão que as veias femorais e poplíteas apresentam-se incompetentes quando o refluxo é maior que 1 s e as demais quando o tempo de refluxo é maior que 0,5 s. As veias perfurantes, entretanto, apresentam-se incompetentes com tempos de refluxo a partir de 0,35 s. Foi comprovado, ainda, não existir necessidade de velocidades acima de 30 cm/s para o adequado fechamento valvar.

Por representarem maior especificidade e sensibilidade, os parâmetros apresentados por Labropoulos et all foram incorporados pelo serviço e serão utilizados como base para o diagnóstico de incompetência valvar.

Terminologia

Desde o fim do século XIX existe uma preocupação com a homogeneização da nomenclatura anatômica, resultando à época em documentos como o Basle Nomina Anatômica, Birminghan Revision e Jenaer Nomina Anatômica, que não eram, no entanto, avalizadas por toda comunidade científica.

Toda essa discussão, entretanto, resultou na criação no início do século XX de um órgão que representava sociedades anatômicas ao redor do mundo, a Federação Internacional das Associações de Anatomistas (FIAA), que no seu quinto congresso em 1950 (Oxford) criou o Comitê Internacional de Nomenclatura Anatômica (CINA). Dos trabalhos desse comitê resultou um documento chamado Parisiense Nomina Anatômica, ou simplesmente Nomina Anatômica, cuja última edição foi lançada em 1983. Ainda no final dessa década o CINA foi substituído por um novo comitê chamado Comitê Federativo em Terminologia Anatômica (CFTA), que elaborou um consenso chamado Terminologia Anatômica, lançado em 1998 e em vigência atualmente.

Entretanto, esse documento não continha os conceitos anatômicos mais recentes elaborados a partir de estudos em cadáver e ultra-sonográficos com Doppler. Para corrigir essa discrepância, anatomistas, radiologistas e cirurgiões vasculares se reuniram no XIV Congresso da União Internacional de Flebologia realizado em Roma em 2001 e elaboraram um documento consensual (4,5) sob os auspícios da FIAA e do CFTA.
Dentre as principais mudanças pontuam-se a descrição pormenorizada de eventuais variações anatômicas, principalmente hipoplasias e aplasias das safenas, a inclusão de termos amplamente aceitos em literatura internacional como das safenas acessórias superficial, anterior e posterior, a caracterização das veias perfurantes pelo seu local de drenagem ou topografia, ao invés de epônimos e a aceitação dos termos veia femoral superficial e veia femoral como sinônimos. Abaixo um resumo com as principais alterações e alguns exemplos de esquemas com alterações patológicas.

Compartimento safeno - definido pela fáscia safena superficialmente e pela fáscia muscular profundamente, contém as veias safenas, artérias e nervos acompanhantes.

Veias safenas acessórias - segmentos venosos que ascendem paralelamente, anterior, posterior ou superficialmente em relação aos troncos principais.

Veia safena magna - ao invés de veia safena interna, longa ou maior.

Veia safena parva - ao invés de safena externa, curta ou menor.

Veia safena magna acessória anterior - qualquer segmento venoso ascendendo paralelamente à safena magna e localizada anteriormente na perna ou na coxa.

Veia safena magna acessória posterior - qualquer segmento venoso ascendendo paralelamente à safena magna e localizada posteriormente na perna ou na coxa.

Veia safena magna acessória superficial - qualquer segmento venoso ascendendo paralelamente à safena magna e localizada mais superficialmente ao compartimento safeno.

Extensão cranial da veia safena parva - inclui todos os tipos de terminação supra-genicular da safena parva, incluída a veia de Giacomini.

Veia safena parva acessória superficial - qualquer segmento venoso ascendendo paralelamente à safena parva e localizada mais superficialmente ao compartimento safeno.

Veia circunflexa anterior da coxa - tributária da safena magna ou da safena acessória anterior ascendendo obliquamente na coxa anterior, podendo originar-se no sistema venoso lateral.

Veia circunflexa posterior da coxa -  tributária da safena magna ou da safena acessória posterior ascendendo obliquamente na coxa posterior, podendo originar-se na extensão cranial da veia safena parva ou no sistema venoso lateral.

Sistema venoso lateral - estende-se na face lateral da coxa e perna, representando o remanescente embrionário da veia marginal lateral.

Veia femoral - ao invés de veia femoral superficial.

Veia intergemelar - veia que corre entre os ventres gastrocnêmios, profundamente à veia safena parva.

Veias perfurantes paratibiais - conectam a veia safena magna ou tributárias às veias tibiais posteriores, correspondendo às perfurantes de Sherman.

Veias perfurantes tibiais posteriores - conectam a veia safena magna acessória posterior às veias tibiais posteriores, correspondendo às perfurantes de Cockett.

Veias perfurantes anteriores da perna - conectam a veia safena magna acessória anterior às veias tibiais anteriores.

Veias perfurantes laterais da perna - conectam veias do sistema venoso lateral às veias fibulares.

Veias perfurantes gastrocnêmias mediais, laterais e intergemelares.

Veias perfurantes do canal femoral - correspondem à perfurante de Dodd.

Veias perfurantes posteromediais e posterolaterais da coxa.

Bibliografia:

1. Quantitative segmental evaluation of venous valvular reflux with duplex ultrasound scanning. Van Bemellen et al J Vasc Surg 1989; 10:425-31.
2. The mechanism of venous valve closure. Van Bemellen et al 1990; 125:617-9.
3. Definitoin of the venous reflux in lower extremity veins. Labropoulos et al J Vasc Surg  2003;38:793-8.
4. Nomenclature of the veins of the lower limbs: An international interdisciplinary consensus statement. Caggiati et al J Vasc Surgery 2002; 36:416-22.
5. Nomenclature of the veins of the lower limbs: Extensions, refinements, and clinical application. Caggiati et al J Vasc Surgery 2005; 41:719-24.