GeneXpert – Uma mudança de paradigma no diagnóstico molecular das doenças infecciosas

Dentre os fatores que podem limitar a ocorrência de casos de diarreia por C. difficile, os mais rele

Diagnóstico das diarreias causadas por Clostridium difficile

As diarreias relacionadas aos cuidados com a saúde, particularmente aquelas secundárias ao uso de antimicrobianos que alteram a microbiota intestinal, são frequentemente causadas por Clostridium difficile, um bacilo gram-positivo esporulado e anaeróbio, cujos principais fatores de virulência são as toxinas A e B. As apresentações clínicas têm gravidade variável, desde diarreia até perfuração de cólon secundária a colite pseudomembranosa. Vários relatos descrevem a maior incidência de diarreia causada por esse agente nos últimos anos, com aumento da duração das internações hospitalares, maiores morbidade e mortalidade e elevação de custos (1-6). Um dos fatores relacionados com a crescente mortalidade é a maior incidência da cepa C. difficile NAP1 – sigla de North America Pulsed field type 1 –, que é hiperprodutora de toxinas A e B.

O bacilo C. difficile representa uma pequena fração da microbiota entérica da maioria dos indivíduos normais, mas o emprego de antimicrobianos que eliminam ou reduzem drasticamente a microbiota anaeróbia intestinal permite sua proliferação sem competição. Alguns antimicrobianos têm efeito mais pronunciado na redução da microbiota anaeróbia entérica e seu uso configura maior risco para a ocorrência de diarreia por C. difficile: clindamicina, quinolonas fluoradas, cefalosporinas e piperacilina-tazobactam. Não só os antimicrobianos estão implicados no aumento do risco de doença causada por C. difficile, pois pacientes em uso de inibidores de bomba de prótons e aqueles submetidos a quimioterapia apresentam maior risco do que a população geral (7). A diarreia por C. difficile (DCD) pode ocorrer em pacientes ambulatoriais e mesmo naqueles sem os fatores de risco clássicos. Alguns relatos na literatura apontam um aumento de casos na comunidade, em particular as gestantes como um grupo de risco (8).

Dentre os fatores que podem limitar a ocorrência de casos de DCD, os mais relevantes são a maior racionalização no uso de antimicrobianos e no ambiente hospitalar e a implementação de medidas de precaução de contato precocemente, de modo a impedir a ocorrência de transmissão cruzada. Para que estas sejam implementadas precocemente, a confirmação diagnóstica rápida, e com elevados valores preditivos negativo e positivo, é fundamental.

O método considerado o padrão-ouro para o diagnóstico é a cultura toxigênica, que consiste no isolamento da bactéria em meio seletivo anaeróbio, seguido de teste para avaliação da produção de toxinas A e/ou B. Em função do tempo necessário para liberação do resultado – de três a cinco dias – , o teste é pouco utilizado na prática clínica. O método com maiores sensibilidade e especificidade, comparado com a cultura toxigênica, é a detecção dos genes que codificam toxinas A ou B, por PCR em tempo real, a exemplo do sistema GeneXpert. Para esse teste, o estudo multicêntrico mais recente, envolvendo 2.296 pacientes, evidenciou sensibilidade de 93,5%, especificidade de 94,0%, valor preditivo positivo de 73,0%, valor preditivo negativo de 98,8% e prevalência de 14,7%  (9).  Os testes de detecção de toxinas ou glutamato desidrogenase têm sensibilidades inferiores e especificidades semelhantes às da PCR em tempo real. O valor preditivo negativo da PCR em tempo real é superior ao dos demais testes, enquanto o valor preditivo positivo é superior ou similar ao dos métodos fundamentados em detecção de antígenos. Várias outras publicações evidenciam que a PCR em tempo real é o exame com maiores sensibilidade e especificidade quando comparado à cultura toxigênica (10-14).

A Biologia Molecular começa a cumprir sua promessa de rapidez no diagnóstico com o sistema GeneXpert para a pesquisa do DNA de C. difficile em amostras fecais. O equipamento é capaz de extrair ácido nucleico da amostra clínica, amplificar e detectar a presença dos genes que codificam toxinas, tudo de forma integrada e automática. Os resultados são obtidos em uma hora após o recebimento da amostra na unidade hospitalar.

Considerando a sensibilidade e a especificidade superiores àquelas dos demais testes de detecção de toxinas, a melhor estratégia diagnóstica atualmente disponível é a PCR em tempo real com o sistema GeneXpert. Em face de um resultado negativo, e persistência da suspeita clínica, o exame indicado para complementação diagnóstica é a cultura específica para C. difficile.

Referências:

1. Ghantoji SS, Sail K, Lairson DR, DuPont HL, Garey KW. Economic healthcare costs of Clostridium difficile infection: a systematic review. J Hosp Infect. 2010 Apr;74(4):309-18.
2. Vonberg RP, Reichardt C, Behnke M, Schwab F, Zindler S, Gastmeier P. Costs of nosocomial Clostridium difficile-associated diarrhoea. J Hosp Infect. 2008 Sep;70(1):15-20.
3. Song X, Bartlett JG, Speck K, Naegeli A, Carroll K, Perl TM. Rising economic impact of Clostridium difficile-associated disease in adult hospitalized patient population. Infect Control Hosp Epidemiol. 2008 Sep;29(9):823-8.
4. Paladino JA, Schentag JJ. The economics of Clostridium difficile-associated disease for providers and payers. Clin Infect Dis. 2008 Feb 15;46(4):505-6.
5. Ananthakrishnan AN, McGinley EL, Binion DG. Excess hospitalisation burden associated with Clostridium difficile in patients with inflammatory bowel disease. Gut. 2008 Feb;57(2):205-10.
6. Kyne L, Hamel MB, Polavaram R, Kelly CP. Health care costs and mortality associated with nosocomial diarrhea due to Clostridium difficile. Clin Infect Dis. 2002 Feb 1;34(3):346-53.
7. Owens RC, Jr., Donskey CJ, Gaynes RP, Loo VG, Muto CA. Antimicrobial-associated risk factors for Clostridium difficile infection. Clin Infect Dis. 2008 Jan 15;46 Suppl 1:S19-31.
8. Severe Clostridium difficile-associated disease in populations previously at low risk--four states, 2005. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2005 Dec 2;54(47):1201-5.
9. Tenover FC, Novak-Weekley S, Woods CW, Peterson LR, Davis T, Schreckenberger P, et al. Impact of strain type on detection of toxigenic Clostridium difficile: comparison of molecular diagnostic and enzyme immunoassay approaches. J Clin Microbiol. 2010 Oct;48(10):3719-24.
10. Knetsch CW, Bakker D, de Boer RF, Sanders I, Hofs S, Kooistra-Smid AM, et al. Comparison of real-time PCR techniques to cytotoxigenic culture methods for diagnosing Clostridium difficile infection. J Clin Microbiol. 2010 Oct 27.
11. Doing KM, Hintz MS, Keefe C, Horne S, LeVasseur S, Kulikowski ML. Reevaluation of the Premier Clostridium difficile toxin A and B immunoassay with comparison to glutamate dehydrogenase common antigen testing evaluating Bartels cytotoxin and Prodesse ProGastro Cd polymerase chain reaction as confirmatory procedures. Diagn Microbiol Infect Dis. 2010 Feb;66(2):129-34.
12. Babady NE, Stiles J, Ruggiero P, Khosa P, Huang D, Shuptar S, et al. Evaluation of the Cepheid Xpert Clostridium difficile Epi Assay for Diagnosis C. difficile Infection and Typing of the NAP1 Strain at a Cancer Hospital. J Clin Microbiol. 2010 Oct 13.
13. Eastwood K, Else P, Charlett A, Wilcox M. Comparison of nine commercially available Clostridium difficile toxin detection assays, a real-time PCR assay for C. difficile tcdB, and a glutamate dehydrogenase detection assay to cytotoxin testing and cytotoxigenic culture methods. J Clin Microbiol. 2009 Oct;47(10):3211-7.
14. Sloan LM, Duresko BJ, Gustafson DR, Rosenblatt JE. Comparison of real-time PCR for detection of the tcdC gene with four toxin immunoassays and culture in diagnosis of Clostridium difficile infection. J Clin Microbiol. 2008 Jun;46(6):1996-2001.