Aplicação do teste cardiopulmonar de exercício no treinamento de atletas | Revista Médica Ed. 5 - 2016

Variáveis avaliadas pelo exame permitem estabelecer a intensidade de treinamento para qualquer esportista

Variáveis avaliadas pelo exame permitem estabelecer a intensidade de treinamento para qualquer esportista


O teste cardiopulmonar de exercício (TCPE) é o método de escolha na avaliação fisiológica de atletas, tendo em vista que possibilita realizar diagnóstico e estabelecer prognóstico da aptidão cardiorrespiratória e da performance de esportistas das mais diversas modalidades, além de individualizar a prescrição de exercícios. 


As variáveis que se destacam e possibilitam o acompanhamento preciso da natureza aeróbica/anaeróbica da atividade física abrangem o consumo máximo de oxigênio (VO2 max), considerado um índice de capacidade funcional, e os limiares ventilatórios, também denominados limiar anaeróbico, ou primeiro limiar (L1), e ponto de compensação respiratória, ou segundo limiar (L2). 


Do ponto de vista fisiológico, o aumento da intensidade do exercício define três fases distintas de fornecimento de energia e dois pontos de intersecção, estabelecidos de acordo com o aumento da produção de ácido láctico.


Os limiares ventilatórios correspondem aos limiares de lactato (LA) sanguíneo (L1 >2,0 mmol/L e L2 >4,0 mmol/L) e determinam três fases de intensidade de treinamento: zona 1, de baixa intensidade (abaixo do L1); zona 2, de média intensidade (entre L1 e L2); e zona 3, de alta intensidade (acima do L2). 


A identificação de zonas de treinamento por intermédio das variáveis fisiológicas do TCPE possibilita a prescrição individualizada e mais segura ao praticante, seja ele inativo, seja atleta, seja cardiopata. Indivíduos sedentários que realizam treinamento com intensidade muito próxima ou no limiar de lactato (L1) demonstram melhora significativa da capacidade aeróbica. Por sua vez, os atletas de elite, em nível de alta performance, utilizam o modelo polarizado, isto é, geralmente treinam abaixo do LA em até 75% das sessões e treinos de distância ou muito acima do limiar em 10-15% do tempo.


Já o VO2 max elevado configura atributo necessário para o sucesso em eventos relacionados à resistência ou como símbolo de saúde geral. Exercícios abaixo de uma intensidade mínima não mudam o organismo suficientemente para resultar em aumento dessa variável ou em melhora nos outros parâmetros fisiológicos. Convém ponderar que tal intensidade pode variar pelo nível de condicionamento preexistente e, em alguns casos, ser difícil de determinar. 


Na prática, o VO2 max individualizado pode ser utilizado por atletas para definir sua capacidade funcional atual e indicar seu avanço. Esportistas bem treinados melhoram com intensidade de treinamento ''quase máxima'', entre 95-100% do VO2 max, enquanto os moderadamente treinados necessitam atingir 70-80% dessa variável para se aprimorar. 


Vale salientar que a principal vantagem fisiológica dos atletas profissionais é sua capacidade de manter cargas de trabalho muito elevadas sem concentrações intoleráveis de lactato no sangue. Em indivíduos sedentários, qualquer estímulo de treinamento, incluindo exercício muito leve, aumenta o LA. Nos atletas bem condicionados, somente exercício muito intenso produz o mesmo efeito, enquanto o VO2 max provou ser de pouca utilidade. Em corredores de elite, a velocidade de corrida e o VO2 no LA respondem por quase toda a melhora da “performance” de corrida. O VO2 max, no entanto, demonstra melhora limitada em resposta ao treinamento e correlaciona-se mal com o desempenho atlético. Além disso, potência e velocidade críticas provaram estar estreitamente associadas com potência e velocidade no LA.

 

Preditores de performance nos diferentes tipos de atleta
Corredores amadoresVO2 no LA e velocidade de corrida
Corredores de distância bem treinadosVO2 max e velocidade de corrida no VO2 max
Ciclistas de resistência (endurance)Potência máxima em 1 hora, potência no LA e VO2 no LA


Prescrição de exercício 


A partir dos resultados expressos no TCPE (figura 2), é possível elaborar uma planilha de treinamento específica para cada atleta, que pode ser organizada, por exemplo, com cinco sessões na semana, distribuídas em cinco dias, cada qual com 60 a 90 minutos de duração, e dois dias não consecutivos para descanso. Nessa programação, o ideal é alternar treinos de intensidades mais leves no primeiro e terceiro dias, com sessões mais intensas no segundo e quarto dias, seguidas por um quinto dia de descanso e um treinamento para fechar a semana, no sexto dia, mais prolongado (90 minutos), com trabalho no L2 ou próximo dele. 


No primeiro e terceiro dias, deve haver a manutenção do ritmo de trabalho, com FC em torno da aferida no L1 e pouco acima, mas sem atingir o valor daquela do L2, caracterizando o que se chama de “queima de gordura, recuperação e manutenção”, isto é, o treinamento aeróbico executado imediatamente abaixo do L1. Já o segundo e quarto dias convém dedicar ao “treinamento de qualidade”, que alterna períodos de “trotes”, na zona de recuperação, com períodos de corridas mais intensas, na chamada “zona de tiros curtos”, no L2 ou acima dele, com duração não superior a 30 minutos por etapa.


O fato é que os limiares determinados no laudo do TCPE, traduzidos em termos de FC, velocidade ou carga de trabalho, permitem estabelecer a intensidade de treinamento aeróbico/anaeróbico para a atividade desejada pelo atleta. Estabelecidos esses parâmetros, há plena possibilidade de elaborar um trabalho individualizado, semelhante ao anteriormente detalhado, com embasamento científico e específico para um determinado período da preparação, assim como com o conhecimento da condição física do momento e dos objetivos propostos.

 

Valores de FC e velocidade máxima e de L1 e L2 encontrados em TCPE de maratonista, expressos em tabela e em gráfico ilustrativo com o modelo adaptado de três fases, proposto por Skinner e cols., e associados à tabela de treinamento baseada na intensidade do esforço físico realizado.


Assessoria Médica
Dr. Alexandre Novakoski F. Alves
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Dr. Antonio Sérgio Tebexreni
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Dr. Eduardo Villaça Lima
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Dra. Ivana Antelmi
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Dr. João Manoel Rossi Neto
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