Como fazer a avaliação pré-participação esportiva | Revista Médica Ed. 6 - 2009

Leia, a seguir, um guia prático para atestar que seu paciente tem todas as condições clínicas para praticar exercícios físicos de forma saudável e prazerosa.

Leia, a seguir, um guia prático para atestar que seu paciente tem todas as condições clínicas para praticar exercícios físicos de forma saudável e prazerosa.

Recomendado pela Associação Americana do Coração (AHA) e pela Sociedade Europeia de Cardiologia, o screening cardiovascular pré-participação esportiva deve ser entendido como uma prática sistemática antes do início da atividade física, feita com o propósito de identificar anormalidades que podem provocar progressão de doenças cardiovasculares preexistentes ou mesmo morte súbita. Independentemente da idade do candidato ao esporte, a análise precisa incluir a história clínica, com ênfase em antecedentes pessoais e familiares, e o exame físico para detectar os fatores de risco cardíaco. A indicação de testes complementares é ainda controversa, sobretudo porque, em vista da baixa prevalência de morte súbita, estamos falando de rastrear muitas pessoas para encontrar um grupo de risco realmente pequeno. A AHA preconiza que a investigação seja aprofundada apenas quando houver indícios de anormalidades, com o uso de eletrocardiograma de repouso, teste ergométrico, ecodopplercardiograma e outros exames de maior complexidade, desde que justificados, ou seja, com base nas informações obtidas pela avaliação clínica. Na Itália, um grupo de pesquisadores criou um programa de screening para jovens atletas competitivos que combina, à anamnese e ao exame físico, o eletrocardiograma já na investigação inicial. Esse modelo, que conta com o endosso de várias entidades esportivas e médicas, incluindo a Sociedade Europeia de Cardiologia, foi responsável por uma redução de morte súbita cardíaca de 3,6 por 100 mil habitantes por ano, antes de sua introdução, para 0,4 por 100 mil. Convém ponderar que a eficácia do programa está comprovada apenas para identificar cardiomiopatias, mas não para detectar anomalias congênitas coronarianas e doença aterosclerótica prematura, que afetam em maior proporção os jovens atletas. Entre as duas correntes, portanto, vale o bom senso e um cuidado redobrado com a avaliação clínica, que, mais uma vez, mostra-se soberana.

Para conhecer o metabolismo basal e o limite físico de cada um

Alguns exames complementares também podem ser bastante úteis para acompanhar indivíduos que praticam ou pretendem praticar atividade física. É o caso do teste de metabolismo de repouso, que ajuda a planejar uma rotina de alimentação para as pessoas que precisam seguir uma dieta diferenciada, combinada a um programa de exercícios. O exame calcula a taxa de metabolismo com base em dados clínicos e na análise dos gases respiratórios (consumo de oxigênio e produção de gás carbônico). Outro recurso que contribui para fazer prescrições individualizadas é o teste cardiopulmonar, visto que discrimina a intensidade de exercício aeróbico segura para cada indivíduo e ainda oferece uma série de detalhes fisiológicos importantes para o seguimento da evolução do paciente, como as necessidades energéticas específicas, a medida do gasto calórico indireto durante a prática esportiva e a determinação da capacidade funcional. Sem contar sua grande utilidade na avaliação e no acompanhamento de portadores de doenças cardiovasculares e pulmonares.

Assessoria Médica
Dr. Antônio Sérgio tebexreni: [email protected]

Do ponto de vista musculoesquelético, a avaliação do esportista exige um bom exame clínico, que inclua uma ampla análise do aparelho locomotor. As diferentes fases da marcha também devem ser observadas e anotadas, assim como a medida, real ou aparente, do comprimento dos membros inferiores, uma vez que frequentemente existe discrepância entre eles, o que causa lesões. Esse check-up ainda requer o complemento da verificação funcional de flexibilidade, da mensuração da amplitude articular e da quantificação da força muscular. Contudo, dependendo da queixa do paciente e do propósito da avaliação, há indicação da realização de exames físicos específicos. Por exemplo, indivíduos que sentem dores no ombro e jogam voleibol devem ter mais bem investigadas e elucidadas suas queixas por meio de testes irritativos, que simulam o movimento da dor. Da mesma forma, praticantes de futebol, com ou sem relato de instabilidade, muitas vezes precisam passar por testes ligamentares para avaliar a movimentação dos joelhos, dada a comum associação do esporte com lesões nessas estruturas.

Com que tênis eu vou?

Ao dar o aval para um indivíduo estrear nas quadras e nas pistas, o médico também deve incluir, nas orientações prescritas, recomendações personalizadas sobre o calçado ideal para a prática esportiva. Afinal, o uso de um modelo errado de tênis pode ocasionar lesões graves por instabilidade. Essa avaliação precisa contemplar os seguintes aspectos:

Finalidade do calçado
Cada tênis possui características especiais, que não permitem adaptações. Portanto, convém avisar logo que simplesmente não é possível usar um calçado de corrida para jogar futebol.

Tipo de pisada
Um modelo com boa absorção de impacto e estabilidade tolera pequenas variações de pronação e supinação. Quando, porém, a pronação se mostra excessiva, o calçado deve contar com maior apoio na parte interna do calcanhar. Por outro lado, a supinação em demasia pede que a absorção seja priorizada no tênis.

Local da atividade esportiva
Dependendo do tipo de solo da prática de atividade física, pode haver maior carga em pés, tornozelos e joelhos. Superfícies muito instáveis, como a areia da praia, provocam fadiga adicional nos membros inferiores. Já os pisos de concreto demandam um esforço mais intenso pela repetição de movimentos, exigindo um calçado com um sistema bem calibrado de absorção de impacto.

Grau de conforto
Uma vez que os demais aspectos sejam atendidos, o conforto sentido pelo indivíduo ao calçar o tênis e se movimentar tem de ser devidamente valorizado. Nesse sentido, a orientação principal para o paciente se resume a testar o tênis ainda na loja antes de levá-lo para casa.

Assessoria Médica
Dr. Páblius Staduto Braga Silva: [email protected]
Dr. Ricardo Nahas: [email protected]

O desempenho de um atleta profissional ou mesmo de um iniciante no esporte também depende de uma alimentação apropriada, que prepare o corpo para suportar o esforço, sem inconvenientes. Por isso, outro ponto de relevo na avaliação pré-participação esportiva está no acompanhamento nutricional, que, basicamente, deve considerar a modalidade esportiva e a intensidade e a duração dos exercícios, assim como o sexo e o estado do indivíduo. De maneira geral, antes do exercício ou de competições, há necessidade de formar reservas energéticas, aumentando a ingestão de carboidratos 24 horas antes, principalmente na última refeição do dia. A ideia é garantir energia para o treino, poupar os músculos e designar proteína para que eles cumpram sua função no momento da atividade. Esse incremento de carboidratos precisa ser acompanhado de uma redução no consumo de alimentos ricos em gorduras e em fibras para evitar desconfortos gástricos na hora do treino ou da prova. Evidentemente, o tempo de digestão tem de ser levado em conta: entre a última refeição e o início de prática física intensa deve haver uma janela de três horas, a não ser que se trate do café da manhã, quando esse intervalo pode ser menor.

A manutenção de um estoque de energia não pode tirar de cena outro protagonista desse capítulo – a hidratação. Ocorre que o estresse do exercício se acentua com a perda de líquidos, que aumenta a temperatura do corpo, prejudica as respostas fisiológicas e o desempenho físico e ainda produz riscos para a saúde, mesmo em caso de desidratação leve ou moderada (2%). Assim sendo, recomenda-se começar os exercícios já com o corpo bem hidratado, com a ingestão de 250 mL a 500 mL de água duas horas antes, e prosseguir a hidratação a cada 15-20 minutos de treinamento, num volume total que varie conforme o nível de sudorese. Quando o treino ultrapassar uma hora ou for muito intenso, mesmo com menor duração, há indicação de repor carboidrato e sódio. Após o exercício, o esportista tem de continuar ingerindo líquidos para compensar as perdas pela urina e pela sudorese. O consumo de carboidratos também é necessário nas duas primeiras horas seguintes para que haja uma nova síntese de glicogênio muscular e seu rápido armazenamento, juntamente com o glicogênio hepático.

Assessoria Médica
Dra. Carla Yamashita: [email protected]