Como investigar os casos suspeitos de infecção por micobactérias de crescimento rápido | Revista Médica Ed. 4 - 2009

Já que cada agente infeccioso tem um perfil próprio de sensibilidade, a definição terapêutica acertada depende muito da identificação da espécie envolvida.

Já que cada agente infeccioso tem um perfil próprio de sensibilidade, a definição terapêutica acertada depende muito da identificação da espécie envolvida.

Os surtos de infecções por micobactérias de crescimento rápido (MCRs) em serviços de saúde vêm sendo constatados em várias cidades brasileiras desde o fim dos anos 90 e dá sinais irrefutáveis de intensificação nesta década. Para ter uma ideia, de janeiro de 2003 a fevereiro de 2009, 2.128 casos foram notificados à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Esse panorama levou a agência a formar, no segundo semestre do ano passado, um grupo de representantes de 19 entidades de saúde – incluindo o Instituto Fleury – para debater e elaborar uma Nota Técnica Conjunta sobre o fluxo de notificações dessas ocorrências e seus aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos.

Segundo a nota, recém-publicada, o agente etiológico mais prevalente na maioria dos pacientes é a espécie Mycobacterium massiliense*, com exceção das infecções secundárias a mamoplastias, nas quais sobressai o M. fortuitum.

Mycobacterium massiliense em microscopia de material de ferida cirúrgica, corado pelo método de Ziehl-Neelsen.

Após estudar a clonalidade do M. massiliense, o grupo de trabalho descobriu que essa espécie resiste a um dos métodos químicos de esterilização mais utilizados, o glutaraldeído na concentração de 2%, mesmo após dez horas de exposição. Tal tolerância explica em boa parte a alta prevalência do agente, mas o problema também parece estar na remoção inadequada de resíduos orgânicos dos instrumentais, que permite a aderência das bactérias, com formação de biofilmes, e sua persistência nos equipamentos.

Uma característica marcante das micobactérias de crescimento rápido está na resistência que apresentam aos medicamentos usados no combate à tuberculose. O M. massiliense, por exemplo, só se mostra sensível in vitro à amicacina, à claritromicina e à tigeciclina. Cada espécie do gênero Mycobacterium, no entanto, tem seu próprio perfil de sensibilidade. Daí a importância de fazer quanto antes o diagnóstico microbiológico, o antibiograma e a identificação do agente por sequenciamento de DNA.

O tratamento precisa ser mantido por um mínimo de seis meses, na maioria absoluta dos casos com o uso concomitante de duas drogas. Sempre que possível, a terapia deve ser combinada à retirada cirúrgica de tecidos desvitalizados e de corpos estranhos ou próteses do sítio infectado.

*Convém lembrar que, até 2004, o M. massiliense era classificado como M. abscessus.

O que fazer diante de um quadro sugestivo de MCR?

O raciocínio diagnóstico deve levar em consideração os aspectos epidemiológicos, as manifestações clínicas e os resultados de exames complementares.

Aspectos epidemiológicos
- Procedimento videoassistido prévio, a exemplo de laparoscopia, broncoscopia, etc.
- Intervenções cirúrgicas recentes, tais como implante de prótese, lipoaspiração, colocação de órtese oftalmológica, ceratotomia, cirurgia plástica, cirurgia ortopédica e cirurgia cardíaca
- Mesoterapia prévia
- Preenchimento cutâneo anterior com ácido hialurônico ou metacrilato
- Injeção por via intramuscular com sinais de inflamação persistente há mais de uma semana

Manifestações clínicas
- Lesões eritematosas de difícil cicatrização
- Lesões nodulares com ou sem drenagem de secreção
- Fístulas, ulcerações e abscesso quente ou frio
- Quadro não responsivo aos tratamentos antimicrobianos convencionais

Investigação diagnóstica
- Cultura geral, bacterioscopia pelo método de Gram e teste de sensibilidade
- Cultura e pesquisa de fungos
- Cultura para micobactérias, pesquisa de bacilos álcool-ácido resistentes (Baar), teste de sensibilidade (antibiograma) e identificação da espécie por sequenciamento de DNA
- Cultura para anaeróbios
- Exame anatomopatológico de um fragmento do sítio infectado
- Ultrassonografia, tomografia ou ressonância magnética nos pacientes com drenagem de secreção em topografia de ferida cirúrgica

Para saber mais sobre o assunto, leia aqui a íntegra da Nota Técnica Conjunta

Assessoria Médica
Dr. Jorge Luiz Mello Sampaio: [email protected]