Urticária | Revista Médica Ed. 3 - 2013

Especialista em urticária, o dermatologista alemão Torsten Zuberbier fala sobre os desdobramentos de seus estudos a esse respeito

Um olho no consenso, outro na clínica

Especialista em urticária, o dermatologista alemão Torsten Zuberbier fala sobre os desdobramentos de seus estudos a esse respeito e destaca a importância de os médicos seguirem os novos guidelines para o diagnóstico correto da doença, evitando o uso de medicações desnecessárias.


Embora seja menos predominante do que a rinite alérgica, a urticária é a alergia mais frequente na pele, com prevalência de mais de 20%. “Ademais, as formas crônicas da doença merecem cuidado especial, pois, além de impactarem nossa qualidade de vida, influenciam a performance de nossas atividades cotidianas”, justifica Torsten Zuberbier a necessidade de estudar a condição e seus impactos, desafio a que se dedica desde 1999. Tanto é assim que, de lá para cá, organizou o I Consenso Internacional de Urticária, publicado em 2000, documento que aborda o diagnóstico e o tratamento da doença e que, em 2012, chegou a sua quarta edição.

Atual professor-adjunto e diretor-geral do Departamento de Dermatologia e Alergia do Hospital Universitário Charité, em Berlim, Zuberbier esteve no Brasil em março deste ano, quando participou de um evento de alergia promovido pelo Fleury e conversou com nossa reportagem. Na ocasião, ele nos revelou em sua entrevista sobre o trabalho que vem desenvolvendo, desde a realização do novo consenso de urticária até as perspectivas de diagnóstico e tratamento para a doença.
Confira a entrevista a seguir.


Torsten Zuberbier
Professor-adjunto e diretor-geral do Departamento de Dermatologia e Alergia do Hospital Universitário Charité, Berlim.

Entrevista concedida à Dra. Barbara Gonçalves da Silva, consultora médica do Fleury.

O que mudou do primeiro consenso, em 2000, até aqui? Havia algo em que acreditavam que foi totalmente refutado ou algumas percepções iniciais só se consolidaram com o tempo?

Muitas mudanças ocorreram. A mais importante entre o primeiro consenso e o atual é o fato de que o aumento da dose do anti-histamínico, que agora pode ser usado até quatro vezes ao dia, sugerido em 2000, está bem estabelecido atualmente e validado por muitos estudos.

Quais são os principais destaques da última edição desse consenso?

Nós acabamos de terminar o consenso e ainda não temos biomarcadores ideais para o diagnóstico dessa doença. Simplificamos a classificação da urticária e o algoritmo de tratamento, reduzindo-o a um sistema de três passos – história, exames diagnósticos e tratamento, deste último vale destacar a anti-IgE.

Como a anti-IgE se aplica no tratamento da urticária?

Está bem estabelecido que a anti-IgE funciona no tratamento da urticária. Seu modo de ação, entretanto, ainda não está totalmente determinado, fato que, certamente, não se deve à diminuição da quantidade de IgE, já que certos tipos de urticária são observados após 12 horas.

O consenso ainda orienta quanto à solicitação racional de exames diagnósticos. Qual o motivo da restrição?

Se, por um lado, hoje a medicina diagnóstica de qualidade tem seu preço, por outro, uma análise completa em indivíduos com urticária crônica é certamente justificável. No entanto, essa investigação precisa se basear em aspectos específicos do histórico de vida do paciente. Daí a importância do consenso, que preconiza que os testes de rotina só devem ser solicitados quando houver correlação com a história clínica, já que há grande diversidade de exames que possibilitam o diagnóstico de urticária.

Em sua opinião, a alimentação pode afetar o surgimento da urticária?

A dieta não afeta diretamente o surgimento da doença, mas pode ser a causadora dos raros casos de urticária por alergia alimentar IgE-mediada. Contudo, na maioria das situações, trata-se de reações pseudoalérgicas, que não são IgE-mediadas. Os agentes desencadeantes nesses contextos podem ser os aditivos alimentares e os compostos aromáticos.

O estresse é considerado vilão em muitas doenças. Problemas emocionais podem desencadear a urticária?

Depende do tipo de urticária. Na crônica, especialmente na espontânea, alguns estudos mostram alterações emocionais correlacionadas. Entretanto, ainda não está comprovada a hipótese de que a questão emocional possa ocasionar a doença.

No Brasil, muitos pacientes com urticária são tratados por não especialistas, o que pode levar ao subdiagnóstico e mesmo ao tratamento incorreto. Essa situação também ocorre na Alemanha?

Temos uma situação confortável na Alemanha, pois há um número suficiente de dermatologistas e alergistas. Entretanto, esse é um problema mundial, pois muitos médicos que não conhecem a doença a fundo, não têm contato com os novos guidelines e acabam, por exemplo, utilizando anti-histamínicos sedantes ou mesmo corticoides em altas doses, que provocam diversos efeitos colaterais.

Nesse sentido, as autoridades de saúde estão sensibilizadas quanto à importância do diagnóstico e tratamento corretos da doença?

Até hoje, muitas doenças dermatológicas são banalizadas pelos pacientes, médicos e também pelas autoridades de saúde. Contudo, a urticária compromete e muito a qualidade de vida do paciente, principalmente a crônica, podendo não responder ao primeiro tratamento preconizado. Nesses casos, observa-se a importância da história clínica, até porque não há um exame específico. Portanto, a urticária deve ser rapidamente tratada e sua causa deve ser investigada.