Infecções urinárias recorrentes em mulher de meia-idade | Revista Médica Ed. 4 - 2014

Mulher de 51 anos, tabagista de um maço/dia, com infecções urinárias recorrentes iniciadas cerca de um ano antes, referia sensação de desconforto após o término da micção, com duração de vários minutos.

Em que pensar ao conhecer a história clínica e avaliar a imagem de cistoscopia?


Mulher de 51 anos, tabagista de um maço/dia, com infecções urinárias recorrentes iniciadas cerca de um ano antes, referia sensação de desconforto após o término da micção, com duração de vários minutos. Além disso, durante os episódios de infecção, apresentava sensação de urgência miccional, com jato urinário diminuído e interrompido. Ao longo do último ano, já havia sido medicada com diversos antibióticos, mas sempre com alívio transitório dos sintomas. 


Negava incontinência urinária no momento da consulta, mas tinha antecedente cirúrgico de correção dessa condição pela técnica de sling de uretra média, por via transobturatória, feita havia três anos. Seu histórico obstétrico, por sua vez, incluía dois partos normais – o último 23 anos antes. 


Os exames físico e ginecológico não apontaram alterações nem sinais de perda urinária às manobras de esforço. Entre os testes subsidiários solicitados, a urina tipo I exibia 1.000 leucócitos por mL e 45.000 eritrócitos por mL, a cultura de urina estava negativa, a creatinina sérica chegava a 0,9 mg/dL e a ultrassonografia pélvica recente mostrava-se normal. Foi feita ainda uma cistoscopia com anestesia local e cistoscópio 20 Fr, que revelou a imagem abaixo.




Citoscopia

ARQUIVO FLEURY


Qual o diagnóstico provável?


A - Cistite bolhosa

B - Carcinoma urotelial da bexiga

C - Perfuração vesical pela tela utilizada na correção da incontinência urinária

D - Divertículo vesical calcificado



Resposta do caso de infecções urinárias recorrentes


O corpo estranho evidenciado pela cistoscopia na parede lateral inferior direita da bexiga, com erosão da mucosa, corresponde a uma perfuração vesical pela tela usada na correção de incontinência. 


O uso da tela sintética suburetral para o tratamento da incontinência urinária de esforço tornou-se uma prática comum, visto que oferece rápida recuperação pós-operatória e retomada precoce das atividades cotidianas. Hoje, considera-se padrão-ouro utilizar slings de uretra média com esse tipo de tela, uma vez que os resultados são favoráveis em mais de 80% dos casos. Vários kits foram introduzidos no mercado uroginecológico, o que proporcionou aumento exponencial no número desses procedimentos em todo o mundo. 


Por outro lado, o crescimento na adoção da técnica também elevou as complicações associadas às telas inabsorvíveis, que acarretam impacto negativo na qualidade de vida das pacientes e ainda aumentam os custos do tratamento. Dentre as situações clínicas que podem ocorrer, as perfurações da bexiga nas correções de incontinência urinária por tela têm incidência de até 7,3%.


Na prática, observa-se que fatores de risco relacionados à paciente – como privação estrogênica, atrofia genital, cirurgias prévias e diabetes –, bem como ao material que constitui a tela, à realização de procedimentos concomitantes e à extensão da incisão cirúrgica, podem favorecer o aparecimento de tais complicações. Os sintomas mais frequentes incluem dor vesical, disúria, urgência miccional, aumento do número de micções, hematúria, infecções urinárias recorrentes, formação de cálculo vesical e fístula vesicovaginal. 


A ultrassonografia é um importante recurso na investigação dessas situa­ções clínicas, porém a existência de graus diferentes de perfuração vesical pode ocasionar resultados falso-negativos. A realização de cistoscopia, por outro lado, constitui-se em uma etapa fundamental para o diagnóstico definitivo.



Assessoria Médica
Dra. Ana do Socorro Costa Creão
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Dr. Fábio Ferro Rodrigues
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Dr. Marcos P. Freire
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Dr. Miguel Jorge Neto
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Dr. José Carlos Truzzi
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