Neurite óptica com mielite aguda | Revista Médica Ed. 3 - 2014

Após revisar os detalhes clínicos e analisar as imagens, do que suspeitar?

Após revisar os detalhes clínicos e analisar as imagens, do que suspeitar?

Paciente do sexo feminino, 42 anos, com déficit de força nos quatro membros, instalado uma semana antes, relatava ainda antecedente de perda da acuidade visual bilateral, iniciada havia cinco semanas em episódio agudo, que a levou à limitação persistente da visão. O exame de RM da coluna cervical demonstrou lesão medular cervical extensa e expansiva (superior à extensão longitudinal de três corpos vertebrais), hipointensa em T1 e com impregnação intensa heterogênea, estendendo-se para a transição bulbocervical (A e B). O estudo do parênquima encefálico (C) mostrou acometimento do quiasma óptico, sem outras alterações focais do sinal da substância branca dos hemisférios cerebrais.

ARQUIVO FLEURY


Qual o diagnóstico provável?


A - Esclerose múltipla

B - Neuromielite óptica de Devic

C - Encefalomielite disseminada aguda

D - Lúpus eritematoso sistêmico

 

Resposta do caso de neurite óptica e lesão medular

Os achados de imagem, embora inespecíficos, no contexto clínico e laboratorial apropriados, sugerem a possibilidade de neuromielite óptica (NMO) de Devic(veja critérios abaixo). Hoje reconhecida como uma canalopatia autoimune, essa síndrome desmielinizante inflamatória manifesta-se por grave neurite óptica uni ou bilateral e por mielite transversa completa, que ocorrem de modo simultâneo ou sequencial, de semanas a anos, mas, em geral, sem comprometer outras regiões do SNC. As características clínicas, laboratoriais e de imagem da doença diferem-na da esclerose múltipla (EM).

Nos estudos de RM, a NMO apresenta-se como uma mielite tumefativa cervical ou torácica às imagens sagitais, tipicamente com extensão longitudinal superior à altura de três segmentos vertebrais, e com grande parte da secção transversa às imagens axiais ponderadas em T2, por vezes com intensa impregnação pelo gadolínio, que pode perdurar por vários meses. A avaliação encefálica pode demonstrar impregnação uni ou bilateral dos nervos ópticos durante a fase aguda do comprometimento inflamatório desmielinizante. Ao contrário da EM, as lesões da substância branca estão ausentes ou em número reduzido nos estágios iniciais. Por outro lado, é comum o encontro de lesões na substância branca subependimária, na distribuição característica do antígeno específico, incluindo o hipotálamo e a região periaquedutal.

Além das imagens, a análise do LCR contribui para distinguir a NMO da EM. Na doença de Devic, a pleocitose do LCR (>50 leucócitos/mm3) está presente com frequência, enquanto a positividade das bandas oligoclonais é menos frequente (20-40%) do que na EM (80-90%). Por fim, a detecção sérica do anticorpo antiaquaporina4, um marcador sorológico específico da NMO, também ajuda a fazer o diagnóstico diferencial em relação a outras afecções desmielinizantes idiopáticas, o que é fundamental para estabelecer o prognóstico e o tratamento. Esse autoanticorpo tem sensibilidade de 73% e especificidade de 97% para a neuromielite e ainda pode predizer a recidiva e a conversão para a doença em pacientes que apresentaram um único surto de mielite longitudinalmente extensa.

  

 

Assessoria Médica
Dr. Antonio Carlos Martins Maia Junior
Dr. Antonio José da Rocha