Respostas nos genes | Revista Médica Ed. 5 - 2015

Especialista da Quest traduz as vantagens de teste hematológico feito por sequenciamento de nova geração.

Especialista da Quest traduz as vantagens de teste hematológico feito por sequenciamento de nova geração


O hematopatologista americano Albert K. Ho, diretor médico da área de Oncologia Molecular da Quest Diagnostics, empresa sediada nos EUA, esteve no Brasil em novembro para dar uma aula sobre o LeukoVantage®, exame que o Fleury incorporou recentemente à sua rotina diagnóstica de doenças hematológicas. O teste pesquisa, ao mesmo tempo, mutações em 30 genes associados a neoplasias mieloides e tem indicações específicas. Nesta entrevista, o médico fala da utilidade prática do novo exame no acompanhamento de tais doenças e o contextualiza com os métodos clássicos, usados atualmente nesse cenário, definindo o papel – e o futuro – de cada um.


Dadas as limitações dos ensaios moleculares direcionados e da citometria de fluxo, como pode uma abordagem orientada às regiões que mais comumente sofrem mutações, dentro de um amplo conjunto de genes, proporcionar monitoração de doença?

Em nossos estudos de validação, quase todos os casos recém-diagnosticados de leucemia mieloide aguda (LMA) têm, ao menos, uma mutação quando o painel de genes é avaliado. Esse perfil individual pode ser utilizado em estudos de seguimento para determinar a resposta.


Para muitas enfermidades, existe um algoritmo diagnóstico. Qual a posição do monitoramento molecular nas doenças hematológicas?

O monitoramento molecular para leucemia mieloide crônica (LMC) e leucemia promielocítica aguda (LPA) está bem estabelecido e a monitoração de resposta a metas específicas é o padrão. No entanto, em outras neoplasias mieloproliferativas (NMP), nas síndromes mielodisplásicas (SMD) e na LMA com citogenética normal, esse acompanhamento baseia-se nos achados clínicos, no hemograma e/ou nas biópsias de medula óssea periódicas. A adição de testes moleculares a esses casos oferece a detecção de baixos níveis de doença a um custo eficaz e eficiente. Isso pode influenciar o seguimento da doença, embora ainda não seja amplamente utilizado.


Quando assume que cada teste (como a citometria de fluxo) ainda tem espaço nesse contexto, qual deverá desaparecer e qual continuará essencial, no seu entender?

A morfologia permanecerá sempre o padrão-ouro para o diagnóstico. O sequenciamento é usado atualmente para detectar mutações de pares de base, bem como pequenas deleções e inserções. Essa técnica prossegue evoluindo de modo muito rápido e, posteriormente, será capaz de reconhecer, com eficiência, grandes deleções e inserções, número de cópias e translocações. A citometria de fluxo ainda terá seu papel na imunofenotipagem, assim como a imuno-histoquímica na avaliação da arquitetura e na expressão proteica.


Quantas vezes devemos repetir a monitoração molecular?

Isso ainda é algo a ser determinado. A frequência de acompanhamento varia. Se houver biópsia de medula óssea, testes moleculares deverão ser realizados, especialmente se as mutações foram detectadas na amostra em que se diagnosticou a doença.


O senhor afirmou, em uma palestra, que a presença de uma mutação não significa neoplasia, que 10% das pessoas acima de 65 anos possuem mutação somática e que esse percentual cresce com o aumento da idade. Podemos dizer que, em indivíduos com mais de 65 anos, esse teste tem baixa especificidade?

Tal como ocorre com muitos outros exames complementares, o LeukoVantage® deve ser interpretado no contexto de todos os achados clínicos e laboratoriais. É bem sabido que as pessoas acumulam mutações com a idade. Por conseguinte, esse teste nunca deve ser usado como triagem, pois a especificidade realmente é baixa. Mutações em certos genes em pessoas saudáveis não significam neoplasia, mas podem ser um fator de risco para o eventual desenvolvimento de doenças hematológicas, ou seja, uma espécie de precursor diagnóstico. Isso se assemelha ao encontro de pequenas populações de anticorpo monoclonal de células B, as quais levam à leucemia linfocítica crônica ou à gamopatia monoclonal de significado indeterminado, que culmina no mieloma múltiplo.


E quanto à sensibilidade e à especificidade do teste de maneira geral?

A sensibilidade e a especificidade dependem dos genes detectados. Para as NMP, o encontro de mutação nos genes JAK2, CALR ou MPL torna o exame muito específico. Mas o achado de mutação ASXL1, TET2 ou DMNT3A no início da SMD não se mostra muito específico. É possível definir os nossos níveis de sensibilidade em 5% dos alelos. Caso o perfil mutacional seja conhecido, podemos ter menores índices para detectar SMD.


Após o tratamento, o que devemos esperar no monitoramento molecular? O desaparecimento das mutações observadas previamente à terapêutica?

Idealmente, gostaríamos de ver o desaparecimento das mutações. No entanto, temos observado todos os tipos de padrões. Às vezes, as mutações permanecem estáveis. Em outras, elas inicialmente diminuem e, em seguida, aumentam. Há situações em que novas mutações surgem e aquelas em que detectamos vários subclones leucêmicos múltiplos, com a regressão de um e a expansão de outro.


Na sua opinião, quais são as direções futuras dessa técnica? 

Creio que a estratégia chegará a se tornar um padrão. Ainda estamos nos estágios iniciais. A tecnologia vai continuar a se aprimorar, os custos vão diminuir, os bancos de dados, melhorar, e mais informações clínicas serão coletadas. Além disso, teremos o desenvolvimento de novas drogas e a análise por sequenciamento de nova geração ganhará mais importância para predizer resposta à terapia.


O senhor tem pets muito diferentes... 

Pode nos contar um pouco dessa sua experiência quase familiar com as tarântulas? 

Se eu não tivesse sido médico, teria sido entomologista. Interesso-me por aranhas desde criança, o que evoluiu de capturá-las em vidros a comprar minha primeira tarântula em 1994. Atualmente, tenho 30 delas em casa, as quais alimento sobretudo com grilos, comprados em lojas para animais, e ocasionalmente com vermes – as maiores comem camundongos-bebês. Minhas tarântulas vêm de vários lugares do mundo, inclusive do Brasil. Sou membro da Sociedade Americana de Tarântulas e participo até de encontros anuais sobre essas espécies.


E já aconteceu de uma delas escapar?

Tento ter muito cuidado, mas, de vez em quando, alguma escapa. Certa vez, enquanto eu as estava alimentando, não notei que uma estava na tampa e, quando eu a abri, a aranha correu pelo meu braço e desapareceu atrás da mesa. Sabia que ela reapareceria e, simplesmente, fechei o quarto. Três dias depois, ouvi um grito vindo de um dos cômodos. De alguma forma, a tarântula passou por baixo da porta e minha esposa a encontrou no canto de outro quarto. Mesmo depois de dez anos, ela não se esqueceu dessa história...


Entrevista concedida à

Dra. Barbara Gonçalves da Silva,

consultora médica do Fleury