A epilepsia é uma disfunção neurológica causada por uma descarga elétrica anormal e excessiva do cérebro, que interrompe temporariamente sua função habitual, provocando alterações súbitas e involuntárias no comportamento, no controle muscular, na consciência e/ou na sensibilidade do indivíduo. Estima-se que haja 60 milhões de epilépticos em todo o mundo, dos quais 3 milhões somente no Brasil. As crises podem ocorrer em qualquer idade, mas têm início mais freqüentemente na primeira e nas últimas décadas da vida, neste último caso geralmente em decorrência de alguma doença, como o acidente vascular cerebral. Apesar da alta prevalência, a epilepsia ainda é cercada de tabus, que vão do receio de ela ser contagiosa até a associação do quadro com problemas espirituais. Como se não bastasse, diante de um ataque epiléptico, quem está ao redor não sabe o que fazer e quem sofre a crise fica inseguro e envergonhado. Contudo, essa disfunção pode ser facilmente tratada na maioria dos casos, de forma que a pessoa possa levar uma vida normal, sem sequer se lembrar de que pode vir a ter uma crise. Prova disso é que a história da humanidade está recheada de personagens que, não obstante a epilepsia, levaram muito mais que uma vida normal, entre eles Alfred Nobel, Dostoievski, Machado de Assis, Júlio César, Flaubert, Alexandre, o Grande e Dom Pedro I, só para citar alguns. |
"A apresentação da disfunção varia conforme o tipo de crise. O mais comum, que responde por 50% dos casos, é o ataque tônico-clônico – também chamado de convulsão –, que envolve todo o cérebro. Neste caso, a pessoa fica rígida, cai no chão e começa a se debater por alguns poucos minutos. A outra metade é formada por três tipos de crises: as parciais complexas, caracterizadas por perda de contato com o ambiente, movimentos automáticos das mãos e confusão mental por de 1 a 2 minutos; as mioclônicas, nas quais ocorrem breves choques ou formigamentos nas mãos e membros, sem perda de consciência; e, finalmente, as crises de ausência, quando há um desligamento completo da pessoa durante cerca de 10 a 20 segundos, várias vezes por dia. O fato é que, aos olhos de quem nada sabe sobre o assunto, tais sintomas acabam sendo confundidos com problemas psiquiátricos. As causas variam muito e incluem fatores genéticos, lesões adquiridas por ocasião do nascimento, malformações, doenças degenerativas do sistema nervoso, tumores, doenças infecciosas e parasitárias que afetam o cérebro, intoxicações, traumatismos cranianos e distúrbios vasculares, metabólicos e nutricionais. O risco de a disfunção ser transmitida dos pais para os filhos existe, mas só é maior – da ordem de 20% a 30% – quando o casal é epiléptico. Apesar de tantas possibilidades, na maioria dos casos não se conhece a origem da epilepsia."
"O diagnóstico da epilepsia é fundamentado na história clínica, e baseia-se na ocorrência de mais de uma crise epiléptica com intervalo superior a 24 horas, sem que exista um fator desencadeante agudo definido, tais como trauma craniano, febre, uso de drogas estimulantes e intoxicação por medicamentos. De qualquer forma, os médicos costumam solicitar exames para complementar a avaliação clínica, especialmente o eletroencefalograma, que nada mais é do que o registro da atividade elétrica cerebral, o qual ajuda a classificar a epilepsia, a escolher a medicação mais adequada e a estabelecer o tempo de tratamento, além de indicar a necessidade de aprofundar a investigação com outros métodos de imagem, como tomografia e ressonância magnética do encéfalo."
"O tratamento costuma ser feito com medicamentos que inibem as descargas anormais do cérebro – os antiepilépticos. Hoje em dia, existem dezenas de medicações diferentes e em 70% dos casos o uso contínuo do remédio é suficiente para controlar completamente as crises. A regularização dos hábitos de sono e a redução dos níveis de ansiedade e de estresse também contribuem para o sucesso da terapêutica. Nos casos de difícil controle medicamentoso, um dos recursos que pode ser utilizado, sempre com supervisão de médico e nutricionista, é a dieta cetogênica, pobre em carboidratos e rica em gorduras, e que leva a um estado de cetose – o qual favorece a inibição das crises. Uma outra alternativa a ser considerada é a cirurgia, que pode estar indicada quando a região que leva à ocorrência de crises encontra-se em área que possa ser removida sem levar ao aparecimento de sintomas neurológicos significativos. Vale lembrar que, durante um ataque epiléptico, não há nenhuma medida que possa abreviá-lo. Deve-se apenas voltar a cabeça da pessoa para o lado, de forma a evitar a aspiração de alimentos, caso haja vômito, e protegê-la da ocorrência de traumatismos. Não é necessário colocar objetos na boca do indivíduo, já que a língua permanece em sua posição normal. A dificuldade de respirar é apenas momentânea e decorre da intensa descarga elétrica do cérebro. Como a epilepsia tem diversas causas e, em muitos casos, a origem é desconhecida, há pouco a fazer em termos de prevenção primária. De qualquer maneira, algumas recomendações são indispensáveis. As crianças devem receber acompanhamento médico constante, do pré-natal à idade escolar, para evitar especialmente as doenças infecciosas mais graves como as meningites, e prevenir o trauma craniano, dois fatores de risco importantes para os ataques epilépticos. Nos adultos, recomenda-se prevenir o acidente vascular cerebral, bastante associado com a epilepsia na terceira idade, o que pode ser conseguido com o controle da pressão arterial, do diabetes e, para quem fuma, com o abandono do tabagismo."