O que considerar no diagnóstico de insônia?

Exames como polissonografia e actigrafia fornecem informações valiosas à investigação.

Um dos principais transtornos do sono, a insônia é definida, segundo a Associação Brasileira do Sono, como uma dificuldade persistente para iniciar, manter e consolidar o sono, a despeito de adequada oportunidade para dormir, que resulta em prejuízo diurno e ocorre por, pelo menos, três vezes por semana, em três meses (quadro 1).

A condição tem prevalência entre 3,9% e 22,1% da população e afeta com mais frequência as mulheres, os idosos e a população de menor nível socioeconômico.

Enquanto, na maioria dos casos, a insônia parte de um evento estressor e se perpetua por mau condicionamento e associações errôneas acerca do sono, em outros, pode também estar relacionada a condições clínicas diversas, como transtornos de humor e de ansiedade, asma, hipertiroidismo, síndromes dolorosas crônicas, insuficiência cardíaca e menopausa, entre outros. Existe ainda a possibilidade de o uso ou a interrupção de medicamentos ou substâncias precipitarem um quadro de insônia, o que, portanto, deve ser sempre pesquisado.

O diagnóstico correto para uma adequada intervenção é fundamental. Em longo prazo, os sintomas diurnos físicos e emocionais podem ter importante impacto no desempenho das funções sociais e cognitivas.

 

Efeitos da insônia: 

  • Acidentes pessoais e de trabalho
  • Distúrbios do humor, como depressão
  • Redução da concentração e da atenção
  • Prejuízo na memória
  • Fadiga e mialgia crônicas
  • Sonolência diurna
  • Redução da libido
  • Associação com o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, pulmonares e gastrointestinais


Quadro 1.
Critérios diagnósticos para o transtorno de insônia crônica*
 
I. Presença de um dos seguintes aspectos:
a) Dificuldade para iniciar o sono
b) Dificuldade para manter o sono
c)  Despertar antes do desejado
d) Resistência em ir para a cama no horário apropriado
e) Dificuldade para dormir sem intervenção de familiares ou cuidadores

II. Presença de um dos seguintes sintomas diurnos relacionados à queixa de sono:
a) Fadiga
b) Déficit de atenção, concentração ou memória
c) Prejuízo do funcionamento social, familiar, ocupacional ou acadêmico
d) Alteração do humor/irritabilidade
e) Sonolência diurna
f) Alterações comportamentais (hiperatividade, impulsividade, agressividade)
g) Perda de motivação
h) Propensão para acidentes e erros
i) Preocupação ou insatisfação com o sono

III. Os sintomas noturnos e diurnos não podem ocorrer na vigência de circunstâncias ambientais e oportunidades inadequadas para o sono.

IV. O distúrbio do sono e os sintomas diurnos correlatos ocorrem, ao menos, três vezes por semana.

V. O distúrbio do sono e os sintomas diurnos correlatos ocorrem por, ao menos, três meses.

VI. O quadro não é mais bem explicado por outro transtorno do sono.

*Classificação Internacional dos Transtornos do Sono (ICSD), 3ª edição.


Como diagnosticar a insônia?

 O diagnóstico da insônia é essencialmente clínico e estabelecido por uma história médica detalhada (quadro 2). A avaliação objetiva sobretudo caracterizar a natureza e a gravidade do distúrbio e identificar fatores desencadeantes ou comorbidades que podem apresentar relevância para o sucesso do tratamento.

Nesse contexto, o diário do sono constitui ferramenta importante para uma análise subjetiva da qualidade e do padrão de sono do paciente, assim como para uma avaliação de seus hábitos e horários, bem como as circunstâncias associadas. É sempre fundamental levar em conta o possível envolvimento de fatores de ordem biológica, ambiental, comportamental ou psicológica.

A presença de doenças sistêmicas precisa ser igualmente investigada e, se necessário, em conjunto com outras especialidades médicas. Em alguns casos, exames complementares podem auxiliar a determinar aspectos objetivos do sono do paciente.

 

Principais diagnósticos diferenciais do transtorno da insônia

1. Dormidor curto: enquanto a maioria dos adultos precisa, em média, de sete a nove horas de sono por noite, há indivíduos que dormem regularmente menos de sete horas, sem prejuízo nas atividades diárias nem relato de sintomas associados ou necessidade de cochilos.

2. Sono insuficiente: Está associado à privação voluntária de sono ou a oportunidades de dormir insuficientes, enquanto a insônia ocorre apesar de haver chance e condições adequadas. Aqui, o indivíduo consegue dormir bem quando tem oportunidades e circunstâncias adequadas.

3. Atraso de fase do sono: O ritmo circadiano é atrasado em relação ao ciclo claro- escuro do ambiente, dificultando o sono em horários convencionais ou necessários para um tempo suficiente. Além de não conseguir adormecer facilmente, o paciente tem dificuldade para acordar em horários predeterminados.

4. Avanço de fase do sono: Mais frequente em idosos. O ritmo circadiano é adiantado em relação ao ciclo claro-escuro do ambiente, levando à dificuldade para manter o sono e ao despertar precoce.

5. Síndrome das pernas inquietas: Caracteriza-se por alterações sensoriais que afetam os membros inferiores, especialmente antes de adormecer, o que causa dificuldade para iniciar o sono. Pode estar acompanhada pelos movimentos periódicos das pernas, provocando um sono fragmentado, com prejuízo de sua qualidade.


O papel da polissonografia na investigação da insônia

A polissonografia é um dos exames mais tradicionais em Medicina do Sono e permite a avaliação objetiva de diversos parâmetros, como o tempo para adormecer, a respiração, a atividade muscular, os estágios do sono e os microdespertares e despertares, entre outros.

Os pacientes com insônia apresentam uma significativa redução do tempo total de sono, um período de latência para o início do sono prolongado e aumento do número de despertares noturnos e do tempo em que ficam acordados durante a noite.

Contudo, o método não é recomendado como rotina na avaliação do paciente com transtorno de insônia, estando indicado, sobretudo, diante de suspeita de outro distúrbio do sono, a exemplo de movimento periódico dos membros, apneia obstrutiva do sono e parassonias, assim como nos casos de insônia resistente ao tratamento adequado.

A polissonografia pode também auxiliar a reconhecer uma percepção inadequada do indivíduo que se queixa de dificuldade para dormir, uma vez que as medidas objetivas nem sempre correspondem à impressão subjetiva do paciente, além de fazer a diferenciação entre insônia com ou sem curta duração do sono.

Vale ponderar que alguns fatores interferem no resultado da polissonografia e devem ser considerados, como o efeito de primeira noite, a variabilidade do padrão de sono entre diferentes noites e a mudança no ambiente e na rotina habitual do indivíduo. Dessa forma, uma única avaliação pode não bastar para detectar as alterações associadas à queixa do paciente.

O Fleury realiza a polissonografia na Unidade República do Líbano I, com ambientação e equipe técnica especialmente dedicadas ao exame, ou no próprio domicílio do paciente, por meio do serviço de atendimento móvel, o Fleury em Casa.


A actigrafia no estudo do ritmo sono-vigília

Exame simples e portátil, a actigrafia usa um aparelho não invasivo semelhante a um relógio de pulso para fazer uma aferição objetiva de parâmetros do sono por meio da análise da atividade motora, temperatura e exposição à luz em um período de dias ou semanas.

Tem particular utilidade na suspeita de alterações do ritmo circadiano sono-vigília, nos casos de insônia e em distúrbios neurológicos e psiquiátricos que possivelmente impactem o sono.

Os dados obtidos pelo método - quantidade diária de horas de sono, regularidade e continuidade dos períodos de sono - complementam as informações relatadas pelo próprio paciente por meio do diário, funcionando, ainda, como uma alternativa para os indivíduos incapazes de oferecer relatos precisos.

Recentemente introduzido no Fleury e também disponível na Unidade República do Líbano I, o exame pode ser feito por períodos de 7, 14, 21 ou 28 dias, conforme a indicação médica.


Referências

1. Insônia: do diagnóstico ao tratamento. Andrea Bacelar, Luciano Ribeiro Pinto Jr. e colaboradores. Associação Brasileira do Sono. 2019.

2. International classification Sleep Disorders. American Academy of Sleep Medicine. 3rd ed. Darien, IL. 2014.

3. Riemann D, et al. European guideline for the diagnosis and treatment of insomnia. J. Sleep Res. 2017; (6): 675-700.

4. Morin CM, et al. Endorsement of European guideline for the diagnosis and treatment of insomnia by the World Sleep Society. J. Sleep Medicine. 2021; (81): 124-126.

5. https://sonoemedicina.com.br


Consultoria médica

Dra. Rosana Cardoso Alves

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