A ultrassonografia com contraste nas doenças vasculares | Revista Médica Ed. 1 - 2017

No início deste século, a ultrassonografia (US) ganhou um novo aliado para o estudo do fluxo: o agente de contraste ultrassonográfico.

O método tem aplicação geral nos territórios arteriais, com destaque para o carotídeo e o aortoilíaco


Dr. André Paciello Romualdo


No início deste século, a ultrassonografia (US) ganhou um novo aliado para o estudo do fluxo: o agente de contraste ultrassonográfico. As primeiras pesquisas para o uso clínico desse recurso se concentraram na avaliação de lesões hepáticas focais, o que levou à publicação do primeiro guideline, em 2004, pela Federação Europeia de Ultrassonografia. Desde então, surgiram novos agentes e suas recomendações se ampliaram, incluindo a avaliação de doenças arteriais.


Nesse campo, as principais e mais reconhecidas indicações da US com contraste estão no território carotídeo, em particular na suspeita de oclusão carotídea e na investigação da vascularização de placas ateromatosas, e no território aortoilíaco, na caracterização do extravasamento no controle de endopróteses aórticas (endoleak).


A US com Doppler das carótidas tem certa limitação para distinguir suboclusão e oclusão bulbar carotídea, uma diferenciação clinicamente importante, visto que, no primeiro caso, ainda há indicação de cirurgia e, no segundo, não. Quando feito com contraste, porém, o ultrassom consegue identificar exatamente o fluxo filiforme residual, dada sua maior sensibilidade para a detecção de fluxos de baixa velocidade que o Doppler.


Já na abordagem de placas ateromatosas carotídeas, é cada vez maior a preocupação com a descrição do seu padrão morfológico, pois muitos pacientes sem estenose luminal significativa acabam tendo AVC à custa de complicações de placas denominadas vulneráveis. Os critérios para determiná-las se relacionam à sua maior hipoecogenicidade e irregularidade, bem como à presença de hemorragia intraplaca ou ulcerações. A US com contraste traz novo subsídio para esse diagnóstico, ou seja, ausência (padrão I) ou presença (padrão II) de vascularização intraplaca, indicativa de neovascularização e, portanto, de maior grau de vulnerabilidade, auxiliando a tomada da decisão terapêutica.


No seguimento de endopróteses para aneurismas de aorta, o aspecto mais relevante é o crescimento do saco aneurismático residual, que pode estar associado a uma complicação cirúrgica (endoleak). Até há pouco tempo, a US com Doppler apenas acompanhava seus diâmetros, tendo pouca sensibilidade na captação do extravasamento em si. A utilização do contraste ultrassonográfico, entretanto, tornou essa caracterização bastante eficiente, com a vantagem de ser realizada em tempo real, sem expor o paciente à radiação nem à possível injúria renal pelo contraste iodado. Em muitos centros, o algoritmo de seguimento já estabelece o emprego dessa modalidade de exame nos controles precoces, intercalada com a angiotomografia computadorizada.


Mas o uso desse recurso na avaliação de doenças arteriais não se limita aos pontos aqui abordados. Em termos gerais, suspeita de oclusão ou caracterização de endoleak em endopróteses também podem ser mais bem avaliadas pelo método nos demais territórios arteriais. Além disso, a circulação de contraste caracteriza melhor as artérias normalmente menos acessíveis ao Doppler, como o território esplâncnico, além de malformações vasculares e fístulas arteriovenosas. O fato é que se trata de uma alternativa viável e interessante, particularmente para pacientes com contraindicações para a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética e com estudo com Doppler inconclusivo.


 

Dr. André Paciello Romualdo é médico sênior dos Setores de Ultrassonografia e Imagem Cardiovascular e autor do livro “Doppler sem segredos” – Elsevier.

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