Aquisições volumétricas na ressonância magnética de pé e tornozelo

Sequências 3D minimizam as desvantagens da técnica bidimensional e diminuem tempo de exame.

A ressonância magnética (RM) é o método ideal para avaliar a integridade ligamentar, as doenças tendíneas e as lesões osteocondrais no pé e no tornozelo, tendo em vista suas imagens multiplanares e alta resolução espacial (1).

Tradicionalmente feita com sequências bidimensionais (2D) de eco rápido (FSE), repetidas em vários planos, a RM de tornozelo tem cada uma dessas aquisições composta por voxels anisotrópicos, o que impede a realização da reconstrução multiplanar (MPR), sem perda da qualidade da imagem (1). Além disso, a espessura dos cortes e o maior espaçamento eles, especialmente no plano axial, podem levar aos artefatos de volume parcial e a lacunas significativas entre as imagens (1,2).

Como o tornozelo apresenta uma anatomia peculiar, com cartilagem de espessura fina, a identificação de alterações do revestimento condral pode ser dificultada, muitas vezes prejudicando a avaliação das lesões osteocondrais, frequentes no domus talar. É possível que a espessura de corte habitual se mostre ineficiente para identificação, mensuração e graduação das lesões condrais nas sequências convencionais (1).

Adicionalmente, a maioria das estruturas ligamentares e tendíneas apresenta trajeto oblíquo em vários planos e deflexões, o que pode tanto limitar a avaliação de lesões verdadeiras quanto também provocar alterações artefatuais de sinal e contornos, resultando em falso-positivos (1,3,4).

Assim sendo, a avaliação convencional deve ser efetuada em múltiplos planos e ponderações, de forma a melhor caracterizar a anatomia e as alterações patológicas. Isso depende, no entanto, de um tempo longo de varredura na realização do exame e na interpretação das imagens pelo radiologista e pelo ortopedista.

Nesse contexto, o Fleury disponibiliza a técnica de aquisição volumétrica 3D na RM do pé e do tornozelo. As sequências 3D minimizam as desvantagens da técnica bidimensional, pois se baseiam na aquisição isométrica com cortes contínuos finos e, portanto, podem ser reformatadas em qualquer plano, de acordo com as estruturas anatômicas e patológicas, sem degradação significativa da qualidade da imagem.

Além disso, os cortes finos permitem reduzir o intervalo entre as aquisições, bem como os artefatos de volume parcial. Assim, não há informações potencialmente não representadas entre as imagens.

Somado a isso, os voxels isométricos permitem a reconstrução multiplanar e a avaliação do tornozelo em qualquer orientação, com apenas uma aquisição de conjunto de dados, reduzindo do tempo do exame (1,3). Nesse sentido, o Fleury dispõe ainda das tecnologias de HyperCube e HyperSense, que reduzem o tempo geral de digitalização em 3D sem comprometer apreciavelmente a resolução espacial ou a qualidade da imagem (7).

O protocolo do Fleury consiste em uma aquisição volumétrica 3D adquirida no plano coronal, ponderada em T2 sem saturação de gordura, com tempo de aquisição estimado em menos de cinco minutos – aspecto particularmente útil para a população idosa –, enquanto a técnica bidimensional exige mais de dez minutos para a obtenção das sequências básicas convencionais.


Discussão

 Alguns estudos destacam as vantagens potenciais oferecidas pela RM 3D-FSE: a relação sinal-ruído (SNR) e contraste-ruído (CNR) da cartilagem, do músculo e do fluido é significativamente maior com o 3D-FSE em relação à sequência 2D-FSE padrão, o que se traduz em melhor resolução espacial e de contraste (1). Apesar de a espessura de corte na imagem tridimensional ser bem mais fina, não há perda da qualidade geral da imagem ou acentuação dos artefatos, em comparação com as sequências 2D.

O Fleury utiliza o estudo 3D em seu protocolo de rotina do tornozelo, especialmente em contextos em que a resolução espacial é essencial para acurada avaliação da doença. Um exemplo é a investigação de neuropatia, tanto em contexto pós-operatório quanto em suspeita de compressão, com uma impressão positiva impactante. Essas sequências vêm aumentando significativamente a detecção de lesões ou compressões nervosas (figura 1).


Figura 1. Paciente masculino, 46 anos, ciclista, com antecedente de pós-operatório de fasciotomia medial três meses antes, evoluindo com dor plantar e alteração da sensibilidade. (A, B, C) Sequências convencionais 2D do tornozelo demonstram padrão de edema do quadrado plantar e do abdutor do quinto dedo (setas curvas em A), além de área fibrocicatricial junto ao marcador cutâneo (setas pretas em B e C). (D, E, F) Sequências 3D obtidas no plano oblíquo e reconstrução no plano sagital permitem a identificação do nervo plantar lateral (seta em D) e do ramo calcaneano inferior (cabeças de seta), cujas fibras encontram-se indefinidas e envolvidas pelas alterações cicatriciais (setas pontilhadas), sugerindo injúria nervosa com denervação subaguda. Nas sequências convencionais, essas informações poderiam ser perdidas devido ao intervalo entre os cortes.


Além disso, percebe-se maior precisão na avaliação do status da cartilagem e da placa óssea subcondral diante de lesões osteocondrais do domus talar (figura 2). Alguns achados são frequentemente avaliados de forma precária em imagens 2D convencionais, com importante implicação clínica e mesmo na decisão cirúrgica, em alguns casos.


Figura 2. (A, B, C) Estudo convencional bidimensional, com espessura de corte de 4 mm, evidenciando lesão osteocondral no ombro medial do domus talar (cabeças de seta), com avaliação limitada do status do fragmentos e alterações císticas subcondrais. (D, E, F) Estudo volumétrico 3D isotrópico com acelerador (HyperCube) caracterizou melhor a extensão da lesão osteocondral, com tênue edema e pequena alteração fibrocística associada (seta em D) e irregularidade da superfície condral (seta pontilhada em E), sem evidência de fragmentos osteocondrais destacados (círculo pontilhado).

Vale salientar que essas sequências ainda têm aprimorado a avaliação dos ligamentos, aumentando a acurácia na detecção e no diagnóstico de lesões ligamentares, mesmo em casos em que as anormalidades são sutis (figura 3).


Figura 3. Paciente masculino, 53 anos, com dor medial no tornozelo iniciada um mês antes, após longa partida de tênis. (A) A aquisição 2D do tornozelo mostra alteração de sinal do tendão tibial posterior e edema medular ósseo no navicular. (B) A sequência volumétrica permitiu caracterizar rotura parcial da inserção mais plantar e distal do tibial posterior, com líquido (setas curvas), interpondo-se entre o tendão retraído proximalmente (setas) e seu sítio de inserção no navicular.


Existem vantagens do estudo tridimensional na avaliação de variantes anatômicas ou deformidades dos pés, como faceta talar acessória ou coalizões, uma vez que é possível reconstruir imagens em qualquer orientação desejada, representando a alteração anatômica, por vezes complexa, de forma mais clara e representativa (figura 4).


Figura 4. Menino de 12 anos com dor em ambos os tornozelos iniciada dois anos antes. (A) Sequência 2D convencional evidencia edema das superfícies apostas da articulação subtalar. (B, C) As aquisições volumétricas facilmente topografaram a coalizão talocalcaneana fibrocartilaginosa, envolvendo difusamente a faceta média e com discreta extensão para as facetas anterior e posterior, permitindo avaliação tridimensional da anormalidade. (D) Estudo tomográfico do mesmo paciente exibe concordância entre os métodos na avaliação da extensão da coalizão.


Os exames de RM do tornozelo, no Fleury, podem ser concluídos em um tempo total de 4 minutos e 47 segundos, usando sequências HyperCube, com uma aceleração HyperSense. A totalidade do tornozelo pode ser visualizada em uma única sequência, sem intervalos de cortes ou artefatos de volume parcial intrínsecos à RM bidimensional (2D-FSE) e seus múltiplos planos de aquisição.


Figura 5. Comparação do tempo de aquisição de um protocolo com coronal T2 Fat Sat + 3D oblíquo versus protocolo convencional 2D versus sequência única 3D HyperCube substituindo ambos, tendo sido todos realizados em aparelho de RM de 1,5 T. O 3D HyperCube levou menos tempo de execução.

Portanto, devido às várias vantagens das sequências 3D, sua aplicação é recomendada no estudo de rotina por RM das regiões do tornozelo e do pé, reduzindo o tempo de varredura, com uma ótima qualidade de imagem.


Conclusões

  • A aquisição volumétrica 3D baseia-se em uma sequência 3D FSE ponderada em T2, que permite a obtenção de cortes finos sem intervalo entre eles, resultando em uma imagem com boa resolução espacial e de contraste, a qual pode ser reformatada em vários planos a partir de uma única obtenção.
  • A aquisição tridimensional reduz o tempo de exame e aumenta a acurácia na detecção de múltiplas doenças do pé e do tornozelo, sendo uma técnica extremamente útil no cotidiano do radiologista e do ortopedista.


Referências

 

1.    Stevens, Kathryn & Busse, Reed & Han, Eric & Brau, Anja & Beatty, Philip & Beaulieu, Christopher & Gold, Garry. (2008). Ankle: Isotropic MR Imaging with 3D-FSE-Cube-Initial Experience in Healthy Volunteers. Radiology. 249. 1026-33.

 

2.    Vandevenne JE, Vanhoenacker FM, Parizel PM, Butts Pauly K, Lang RK. Reduction of metal artefacts in musculoskeletal MR imaging. JBR-BTR. 2007;90(5):345–349.

 

3.     Bae WC, Ruangchaijatuporn T, Chung CB. New Techniques in MR Imaging of the Ankle and Foot. Magn Reson Imaging Clin N Am. 2017;25(1):211–225. 

 

4.     Sofka, C. M. (2017). Technical Considerations. Magnetic Resonance Imaging Clinics of North America, 25(1), 1–10.

 

5.    Naraghi, A., & White, L. M. (2012). Three-Dimensional MRI of the Musculoskeletal System. American Journal of Roentgenology, 199(3), W283–W293.

 

6.    Mugler JP 3rd. Optimized three-dimensional fast-spin-echo MRI. J Magn Reson Imaging 2014;39:745–67.

 

7.     King K. HyperSense Enables Shorter Scan Times Without Compromising Image Quality. SIGNA Pulse of MR, Autumn 2016;48-51.

  

Consultoria médica 

 

Dr. Marcelo Nico
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Dra. Isabela Azevedo Nicodemos da Cruz
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