Na prática do tratamento oncológico, diariamente somos confrontados com situações clínica ambíguas que podem influenciar muito as decisões terapêuticas e ter grande impacto na vida das mulheres com câncer de mama.
É indiscutível o aumento da incidência dessa neoplasia na população feminina mundial, e também na brasileira, e cada vez mais nos deparamos com mulheres jovens, abaixo da idade recomendada para o rastreamento mamográfico, com tumores que exigem estudo biológico detalhado para que se possa escolher a melhor estratégia de tratamento. Os avanços tecnológicos, a disponibilidade de exames mais individualizados e mais acessíveis têm dado um embasamento científico às decisões terapêuticas, e permitido escolhas conservadoras mais seguras, tanto para as pacientes, quanto para os médicos envolvidos em seu tratamento.
Neste relato, trazemos um caso justamente representativo dessa situação. Em 2017, uma paciente feminina, com 36 anos, amamentando há 2 anos, apresenta-se na consulta de rotina ginecológica pós-parto com uma queixa palpatória de nódulo endurecido no quadrante superolateral (QSL) da mama direita, junto à aréola. Refere que sente melhor o nódulo após a amamentação, quando a mama fica menos túrgida. Na história clínica, refere menarca aos 11 anos, e 3 casos de câncer de mama na família (tia-avó materna, aos 68 anos, e duas primas de 1º grau, ambas com menos de 50 anos). Na ultrassonografia mamária (USOM), foi identificado nódulo verticalizado em QSL da mama direita, com 2,5 cm, próximo da região retroareolar. Na axila direita, nível 1, havia um linfonodo com volume aumentado (3,5 cm), porém sem espessamento cortical ou obliteração hilar ao USOM. Foi realizada, em fevereiro de 2017, mamotomia do nódulo mamário e punção aspirativa por agulha fina (PAAF) do linfonodo axilar.
Ao exame anatomopatológico, confirmou-se o diagnóstico de carcinoma mamário invasivo de tipo não especial (ductal; CDI), grau 2 histológico, com expressão moderada de receptores hormonais (RE – 90%; RP – 80%, Ki-67 de 35%, HER2 com expressão parcial fraca, descontínua, na membrana de 10% das células neoplásicas – escore 0 – zero). A PAAF do linfonodo não evidenciou células neoplásicas.
A ressonância magnética e o PETCT evidenciaram apenas a lesão mamária direita, sem evidência de comprometimento de linfonodos axilares. Optou-se por realização de cirurgia conservadora da mama (setorectomia) com avaliação intraoperatória das margens e biópsia de linfonodo sentinela axilar direito. O AP da peça confi rmou o diagnóstico da biópsia, mas evidenciou cerca de 20% de padrão micropapilar da neoplasia, com dimensão de 1,8 cm. No linfonodo, foram encontradas células tumorais isoladas subcapsulares (grupos menores que 1 mm) – Estadio patológico: pT1c pN0(i+). O escore de HER2 foi de 2+, com marcação heterogênea da proteína na membrana celular de 20% das células neoplásicas. Foi solicitado exame de FISH para HER2, realizado em março de 2017, que veio com resultado negativo – não amplificado.
Considerando-se o caso de paciente jovem, 36 anos, amamentando, com história familiar positiva, tumor de 1,8 cm, índice proliferativo de 35%, e HER2 fraco no tumor, havia uma forte inclinação para realização de quimioterapia adjuvante. A equipe da Oncologia decide realizar o exame de Oncotype DX®, como tentativa de respaldar a pequena chance de não realizar a QT adjuvante. O exame foi realizado em abril de 2017, com Escore de Recorrência (RS) de 15.
Com base nesse resultado, optou-se por introdução de hormonioterapia com tamoxifeno por 5 anos e bloqueio ovariano com gosserrelina por 2 anos. A paciente não tolerou o bloqueio hormonal, e parou o tratamento após 1 ano e 3 meses, mas manteve o tamoxifeno até o final dos 5 anos. Foi também submetida a radioterapia (26 sessões, dose:52,56Gy). No acompanhamento clínico e radiológico, não apresentou nenhuma lesão ou sinais de recidiva da lesão até o presente momento.
O Oncotype DX® é utilizado para determinar o benefício esperado da quimioterapia no câncer de mama em estágio inicial, podendo predizer quais pacientes se benefi ciarão, ou não, deste tratamento.
Em 2018, os resultados do estudo clínico adjuvante sobre o câncer de mama, chamado TAILORx, foram publicados. Trata-se de um estudo clínico prospectivo e randomizado, onde foram estudados 10.273 pacientes com câncer de mama inicial, sem comprometimento linfonodal. O estudo foi atualizado, analisando 12 anos de seguimento – TAILORx Update: 12-Year Recurrence and Survival Outcomes (Last Updated: 05/31/2023).
Os resultados do estudo concluíram que a quimioterapia não reduz o risco de retorno do câncer em pacientes com resultados de RS de 0 a 25. A maioria das pacientes com câncer de mama em estágio inicial, com linfonodos negativos. Uma análise exploratória sugeriu que mulheres com 50 anos ou menos poderiam obter um benefício modesto com a quimioterapia, a partir de um resultado do RS de 16. Esse benefício cresce à medida que o número aumenta para 25 ou mais. As pacientes com RS de 15 ou menos não apresentam benefício com a quimioterapia.
Neste caso emblemático, podemos observar o enorme impacto dos testes diagnósticos complementares nas decisões terapêuticas, em especial o teste genômico, que proporcionam a avaliação personalizada da biologia tumoral e uma estimativa concreta, respaldada nos dados da literatura, dos benefícios e riscos para as pacientes, e minimizando os impactos do tratamento em sua qualidade de vida.
Colaboração:
Dr. Marcelo Oliveira dos Santos é oncologista Clínico do Hospital Alemão Oswaldo Cruz
Dra. Monica M. A. Stiepcich é patologista do Grupo Fleury
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