Como interpretar a variabilidade dos valores de TSH

Situações fisiológicas podem causar alterações do hormônio estimulador da tiroide.


A avaliação da função do eixo hipófise-tiroide é realizada principalmente pelas dosagens do hormônio estimulador da tiroide (TSH) e da fração livre do hormônio tiroidiano tiroxina (T4 livre).

O principal controle da secreção do TSH é exercido pela alça de retroalimentação negativa dos hormônios tiroidianos. Os níveis basais tendem a ser estáveis do ponto de vista individual e o ponto de equilíbrio entre o TSH e os hormônios da tiroide tem um grande componente genético. Além disso, essa secreção respeita um ritmo circadiano – observam-se concentrações mais baixas durante a tarde, seguidas por um aumento durante a noite e por um pico na primeira parte da madrugada, por volta das 3 horas da manhã, variando de 0h às 5h30. Após o início do sono, os níveis de TSH diminuem. A privação do sono e o exercício físico realizado à noite podem postergar a elevação do hormônio. Já o jejum prolongado reduz a secreção e o pico noturno de TSH1.

Contudo, várias situações fisiológicas e patológicas podem alterar tanto os níveis de secreção basal quanto o controle da hipófise pela tiroide. Daí por que a recomendação, sobretudo diante do diagnóstico de um hipotiroidismo subclínico (TSH elevado com valores normais de T4 livre), da confirmação dos níveis do TSH com uma segunda avaliação.

Variações em um mesmo indivíduo

Dois estudos avaliaram resultados seriados de TSH em indivíduos saudáveis, os quais demonstraram variação em um mesmo indivíduo. Meyerovitch e cols. analisaram as dosagens de TSH de 422.242 adultos. Destes, 3% apresentaram resultado elevado (de >5,5 a ≤10 mIU/L) e 0,7% estavam muito elevados (>10 mIU/L) inicialmente. Já em uma segunda avaliação, sem nenhuma intervenção clínica, 62,1% do primeiro grupo e 27,7% do segundo tiveram normalização dos níveis de TSH2.

Lazar e cols. realizaram avaliação similar em uma população pediátrica composta de 121.052 pacientes ambulatoriais com idade até 16 anos. Dessas amostras, 2,9% evidenciaram concentrações séricas elevadas de TSH (de >5,5 a ≤10 mIU/L) e 0,4%, muito elevadas (>10 mIU/L). Na segunda determinação do hormônio, houve normalização em 73,6% e 40% daqueles cujo TSH sérico inicial estava alto e muito alto, respectivamente3.

Causas de oscilações do TSH

Algumas medicações podem causar alterações do TSH em pacientes previamente sem doença tiroidiana, a exemplo de iodo, amiodarona, lítio, inibidores da tirosinoquinase, corticosteroides, análogos de somatostatina e agonistas dopaminérgicos4.

Já em indivíduos com diagnóstico de hipotiroidismo em uso de levotiroxina, há alguns fatores associados com oscilações do TSH4:

1. Questões relacionadas à administração da medicação:
• Falta de observação das orientações corretas de jejum de 30 minutos após a ingestão da levotiroxina
• Uso concomitante de ferro, cálcio, inibidores de bomba de prótons, sucralfato, hidróxido de alumínio, colestiramina

2. Má absorção:
• Doença celíaca
• Intolerância à lactose
• Gastrite atrófica

3. Aumento da metabolização do hormônio tiroidiano:
• Uso de fenitoína, carbamazepina, fenobarbital, rifampicina e alguns inibidores da tirosinoquinase (por exemplo, imatinibe)

4. Aumento da capacidade de ligação do hormônio tiroidiano à globulina ligadora de tiroxina (TBG), resultando em elevação da fração total do T4, com necessidade de maior dose de reposição:
• Uso oral de estrógeno
• Uso de gonadotrofinas
• Mitotano
• Moduladores seletivos dos receptores de estrógeno

Considerações finais

Em conclusão, pacientes em rastreamento de alterações da função tiroidiana podem apresentar oscilação do TSH por diversos fatores fisiológicos e clínicos. Por isso, a critério clínico, deve ser realizada confirmação da dosagem em uma nova análise, pois um resultado normal não é incomum, principalmente nos valores pouco elevados.


Referências

1 - Endocr Rev. 2013 Oct;34(5):619-57. doi: 10.1210/er.2012-1076. Epub 2013 Apr 10.
2 - Arch Intern Med. 2007;167(14):1533-1538. doi:10.1001/archinte.167.14.1533.
3 - Lazar L, et al. J Clin Endocrinol Metab 941678-1682, 2009.
4 - O. Koulouri et al. Best Practice & Research Clinical Endocrinology & Metabolism 27 (2013) 745–762.
5 - Clin Biochem Rev. 2003 Nov; 24(4): 109–122.


CONSULTORIA MÉDICA

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