A saúde dos idosos é tema de grande interesse médico devido ao aumento dessa população no Brasil e em muitos países no mundo. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cresceu o número de brasileiros com 60 anos ou mais devido à elevação da expectativa de vida, atualmente com média de 76,7 anos. O maior acesso à saúde, à informação e à educação e a melhora da qualidade de vida foram fatores fundamentais para esse incremento.
A pele é o maior órgão do corpo humano e recobre os demais sistemas e tecidos, fazendo a interface entre o meio interno e o externo, sendo também o local em que mais se evidencia o envelhecimento do indivíduo devido à sua exposição visual. Sofre influência não apenas dos eventos intrínsecos e inerentes ao envelhecimento (senescência), mas também de elementos externos, como a radiação ultravioleta, medicamentos, toxinas e doenças sistêmicas (senilidade).
A Dermatologia Geriátrica é uma subespecialidade que estuda as modificações associadas à senescência e os distúrbios cutâneos associados à senilidade, buscando diagnósticos precisos e tratamentos adequados para a população idosa. Para tanto, a avaliação global da pele e anexos cutâneos é fundamental, bem como uma anamnese cuidadosa com detalhamento de antecedentes patológicos e medicações em uso.
No exame dermatológico, é importante identificar as alterações relacionadas à senescência para que o paciente seja informado de que essas modificações fazem parte do processo de envelhecimento natural, evitando-se, assim, preocupações e intervenções excessivas.
O que o fator tempo faz com a pele |
Afinamento e ressecamento visíveis |
Maior risco de erosões e úlceras |
Cicatrização mais lenta |
Mudança na quantidade de melanócitos, com coloração diferente da pele e dos pelos |
Menor capacidade de metabolização cutânea da vitamina D |
Atrofia da derme e do tecido celular subcutâneo, com formação de rugas e alteração do turgor e da elasticidade da pele |
Em decorrência da atrofia, fragilidade cutânea e maior risco de púrpura senil |
Redução da espessura e da quantidade de pelos e diminuição do tamanho e da função de glândulas sudoríparas e sebáceas, resultando em xerose cutânea |
Mudança na taxa de crescimento das unhas, levando a distrofias ungueais |
Maior risco de inflamação, infecção e desenvolvimento de tumores cutâneos devido à vigilância imunológica menos eficiente |
Maior absorção e penetração de medicações tópicas |
Radiação ultravioleta
A exposição à radiação ultravioletagera danos ao DNA que se acumulam ao longo dos anos. Por isso, alterações cutâneas decorrentes da exposição solar são muito comuns nos idosos, ocasionando exacerbações das modificações causadas pela senescência e maior risco de desenvolvimento de lesões malignas.
As queratoses actínicas são lesões pré-malignas localizadas nas áreas de fotodano importante e podem se transformar em carcinoma espinocelular.
Já o carcinoma basocelular é uma neoplasia cutânea associada à exposição solar intensa e que, somado aos casos de carcinoma espinocelular, contabiliza cerca de 70% de todos com tumores malignos diagnosticados. Seu diagnóstico é clinicopatológico e, na maioria dos casos, tem bom prognóstico.
Apesar da menor incidência (4%), o melanoma é o tumor cutâneo mais letal (80%), com número de casos em ascensão. A exposição solar intensa e o antecedente de queimaduras solares na infância, bem como a história familiar e pessoal de melanoma e imunossupressão, entre outros, estão entre os fatores de risco para essa neoplasia, cujo diagnóstico é de suma importância para um melhor prognóstico.
Portanto, recomenda-se a realização do exame dermatológico completo anual em todos os pacientes e, para aqueles com alto risco para melanoma, o mapeamento corporal total pode ser indicado. Ademais, orientações quanto à fotoproteção com barreiras químicas (protetores solares) e físicas (roupas com proteção UV) têm grande utilidade para a prevenção de envelhecimento cutâneo e de câncer de pele.
Há inúmeras afecções dermatológicas que acometem os idosos, elas podem ser doenças cutâneas primárias ou secundárias, de etiologias distintas. A inspeção da pele nas consultas médicas pode auxiliar a identificação de lesões cutâneas, sendo indicado o encaminhamento do paciente ao dermatologista em caso de dúvida diagnóstica e para auxílio no manejo terapêutico.
A fotoproteção é a principal medida de prevenção contra tumores cutâneos, devendo ser sempre incentivada, independentemente da idade do paciente.
A abordagem multidisciplinar de pacientes idosos com doenças de pele é importante para evitar tratamentos excessivos e melhorar sua qualidade de vida.
Infecções e outras condições
As doenças infecciosas são muito comuns nos idosos devido à redução da imunovigilância nesse grupo. As infecções cutâneas que mais incidem em tal população incluem micoses superficiais, como a dermatofitose e a candidíase, especialmente na área de fraldas, as piodermites, com erisipela e celulite, e o herpes-zóster, causado pela reativação do herpes-vírus tipo III, gerando lesões cutâneas e dor na fase aguda, que pode se tornar crônica e incapacitante (neuralgia pós-herpética). Contra o herpes-zóster, vale lembrar, recomenda se a vacinação para reduzir o número de casos e de complicações por essa doença.
Por sua vez, o prurido é uma queixa dermatológica muito comum nos pacientes geriátricos, podendo causar grande comprometimento na qualidade de vida. A alteração da barreira epidérmica, lesões neurológicas centrais e periféricas e distúrbios imunológicos podem estar associados à fisiopatologia do prurido. Alterações associadas
à senescência (xerose cutânea), doenças cutâneas primárias (eczema, penfigoide bolhoso, dermatomiosite), prurido autotóxico (prurido paraneoplásico, colestase, doença renal crônica, diabetes mellitus) e doenças neuropáticas e psicogênicas estão entre as causas da condição. Dessa forma, a investigação da etiologia torna-se imperativa para o manejo correto de tais casos.
A diminuição do leito vascular cutâneo provoca fragilidade capilar (de pequenas veias e artérias que nutrem a pele), a qual, combinada ao ressecamento cutâneo, contribui para que pequenos traumas se tornem hematomas ou ferimentos. Esse quadro pode ser agravado pelo uso de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes, medicações comuns entre a população geriátrica. Assim, cuidados como proteção e hidratação da pele devem ser orientados.
Falando em fármacos, as reações cutâneas a medicamentos, também denominadas
farmacodermias, são realmente comuns em idosos, sobretudo em casos de internação associados à polifarmácia.
As manifestações cutâneas variam, indo desde casos leves (exantema maculopapular) a casos graves (DRESS, síndrome de Stevens-Johnson e necrólise epidérmica tóxica). Quando há gravidade, indica-se a internação do paciente e acompanhamento multidisciplinar.
Outra queixa dermatológica muito frequente na população geriátrica são as úlceras, cujas causas mais comuns abrangem as úlceras de estase, vasculares (arteriais, venosas ou mistas), de pressão e neuropáticas. O diagnóstico adequado da etiologia, em conjunto com uma abordagem multidisciplinar, com curativos e tratamento da doença de base, configura a base para a terapêutica adequada de tais afecções.
É importante ressaltar que a queixa da lesão cutânea nem sempre será mencionada pelo idoso em consultas médicas. Dessa forma, a inspeção da pele deve ser realizada em consultas pelo geriatra ou por outros especialistas. Havendo dúvidas quanto ao diagnóstico, referenciar esse paciente ao dermatologista é importante para que a identificação correta da lesão seja feita, assim como a instituição do tratamento apropriado, visando ao cuidado global e à melhora da qualidade de vida do paciente idoso.
Consultoria Médica
Dra. Anna Laura Gedda
Consultora médica em geriatria
[email protected]
Dra. Lilian Kelly Faria Licarião Rocha
Consultora médica em dermatologia
[email protected]
Dra. Tatiana Mina Yendo
Consultora médica em dermatologia
[email protected]
Referências
• www.ibge.gov.br
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Dados da OMS de 2022 revelam que há cerca de 254 milhões de portadores de hepatite B no mundo.
Avaliação complementar da análise histológica convencional de lesões pré-neoplásicas e neoplásicas.
Pode ser utilizada para detectar o DNA da bactéria Leptospira spp. no plasma.
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