Estudos mostram grande impacto da pandemia no manejo da doença

A pandemia comprometeu outros cuidados de saúde, incluindo os relacionados ao câncer de mama.

A pandemia da Covid-19 comprometeu outros cuidados de saúde, incluindo os relacionados ao câncer de mama. Isso afetou desde o rastreamento e diagnóstico até o tratamento, gerando potencial impacto no prognóstico futuro da doença.

A resposta inicial à pandemia na assistência médica foi de evitar os atendimentos não urgentes e modificar algoritmos diagnósticos e terapêuticos. Na Radiologia Mamária, recomendou-se adiar todos os exames de rastreamento e se estabeleceu uma escala de prioridades para exames diagnósticos e biópsia – nos EUA, por exemplo, o rastreamento era prioridade C.

Todo o conjunto de recomendações, incluindo o fechamento de centros radiológicos, teve um forte reflexo na Radiologia, mas acometeu de maneira desproporcional a área de Imagem Mamária, com interrupção quase total do rastreamento e uma redução significativa dos exames diagnósticos e de biópsias. Segundo o Stanford Health Care, a Radiologia Mamária foi uma das especialidades mais afetadas pela pandemia, com redução do volume de exames de 28%, em comparação a meses anteriores. Entre os métodos de imagem, a mamografia foi a menos realizada, com redução de 80%.

Dados do Breast Cancer Surveillance Consortium (BCSC), de março a setembro de 2020, mostram que 97% dos centros fecharam ou tiveram sua capacidade reduzida. Embora todos tenham sido reabertos em agosto do mesmo ano, 14% ainda não funcionavam normalmente no mês seguinte. Nas instalações que compõem o BCSC, o rastreamento ficou comprometido em mais de 90% e as biópsias, em cerca de 60%.

No Brasil, observou-se queda de 88% no número de mamografias feitas no Fleury, de 87% no Hospital das Clínicas da FMUSP e de 76% no SUS, quando se compara abril de 2020 a abril de 2019. Na Holanda, nas semanas 12 a 26 de 2020, os centros de rastreamento foram fechados e a taxa de detecção de câncer de mama nas semanas 14 a 25 foi quase zero.



Em junho de 2020, a imprevisibilidade do fim da pandemia se tornou clara, bem como o potencial impacto no prognóstico do câncer de mama, em decorrência do atraso no diagnóstico e no tratamento da doença. Destaca-se que existe um intervalo ideal para o rastreamento, que deve ser menor que o lead time médio do tumor de mama. Se esse intervalo for longo, não se detectam lesões agressivas em estágios iniciais. O rastreio anual maximiza a redução da mortalidade pela maior detecção de cânceres pequenos e redução da incidência de tumores avançados ou metastáticos.

Além disso, um estudo feito em pacientes com câncer de mama mostrou que a realização de mamografias seriadas consecutivas associou-se com maior diminuição na mortalidade em relação à realização não consecutiva. Com a interferência da pandemia nessa rotina, espera-se um aumento dos casos de tumores avançados e o potencial impacto no prognóstico, especialmente nos países em que o rastreio é bienal ou trienal.

Existe ainda um prazo máximo para o diagnóstico e o tratamento. A ausência de providências por mais de três meses após a suspeita clínica e radiológica do câncer de
mama pode reduzir em 12% a sobrevida em cinco anos. Outra evidência que atinge o prognóstico veio de um estudo holandês que avaliou cinco propostas de retomada após seis meses de interrupção no rastreio organizado. Com a estratégia de não repor os exames perdidos ou de atrasar o rastreamento em todas as mulheres, há um aumento na taxa de mortalidade nas próximas décadas. No caso de atraso, essas taxas não retornariam aos índices de normalidade.

Com a retomada gradual dos serviços de atendimento, em 2020, no cômputo geral, não houve recuperação no número de mamografias no Brasil. Da mesma forma, em 2021, o volume de exames realizados no Fleury ainda continuou abaixo do registrado em 2019.


Entidades médicas sugerem estratégias para evitar investigações desnecessárias de linfonodos pós-vacina

A vacina contra a Covid-19, a despeito do inquestionável efeito protetor, pode ocasionar reações sistêmicas e locais geralmente leves. Entre elas, há o aumento de linfonodos regionais ipsilaterais ao sítio de injeção. Linfonodos inflamatórios após vacinação ocorrem com vários imunizantes e são secundários à ativação de antígenos locais. A aplicação no músculo deltoide afeta os linfonodos axilares e supraclaviculares ipsilaterais, que podem ser sintomáticos (palpáveis e/ou dolorosos) ou assintomáticos, detectados por métodos de imagem.

Um estudo de fase III da Moderna mostrou que a linfonodopatia sintomática autorrelatada ocorreu em 10,2% dos vacinados, após a primeira dose, e em 14,2%, após a segunda dose,
com frequência maior nos indivíduos com mais de 18 anos e menos de 65 anos. Também se observou que o evento ocorreu de dois a quatro dias após a aplicação do imunizante, com duração média de dois a quatro dias. Esses dados provavelmente subestimam a frequência de linfonodopatias assintomáticas encontradas em exames de imagem.

Um trabalho que avaliou a mamografia de 750 mulheres feita até 90 dias após a vacinação encontrou um índice de 3% de linfonodopatias axilares, das quais 91,3% eram assintomáticas. A incidência não foi afetada pelo número de doses ou o tipo da vacina, mas pelo tempo de imunização, com diminuição da quantidade de linfonodos à medida que aumenta o intervalo desde a aplicação do imunizante.

Surgiu a preocupação de que a presença de linfonodos inflamatórios possa causar dúvidas diagnósticas e resultar em muitos exames adicionais e biópsias, por causa da vacinação
em larga escala. Por esse motivo, diferentes organizações médicas, incluindo o CBR, a SBM e a Febrasgo, bem como painéis e opiniões de especialistas, publicaram algumas diretrizes para o atendimento na Imagem Mamária, que incluem a coleta de dados sobre o status vacinal (número de doses e datas), o local da vacinação, no braço ou na coxa, e a lateralidade, bem como a orientação para que as doses sejam aplicadas no mesmo braço na população geral e, nas pacientes com história de câncer de mama, no braço contralateral ou na coxa.

Também se recomenda que o exame de imagem de mama seja feito preferencialmente antes da vacinação ou, se possível, de quatro a seis semanas após a segunda dose. Contudo, não se deve atrasar a imunização devido a rastreios pré-agendados, tampouco adiar exames com impacto na saúde, como mamografias de rastreamento, por vacinação recente.

Há apenas uma divergência na conduta quando se encontra linfonodopatia no exame pós-vacinação. O CBR, a SBM e a Febrasgo sugerem classificar o achado na categoria BI-RADS 3. Já outras organizações, como a Eusobi, sustentam que a conduta deve se basear no contexto clínico e no risco de metástases axilares, o que parece ser mais coerente.


Consultoria Médica

Dr. Luciano Fernandes Chala
[email protected]

Dra. Giselle Guedes Netto de Mello
[email protected] 


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