HE4 e câncer de ovário

O câncer de ovário é a terceira neoplasia mais frequente do sistema reprodutor feminino.

O câncer de ovário é a terceira neoplasia  mais frequente do sistema reprodutor  feminino, ocupando a nona posição em  incidência de câncer nas mulheres no  mundo, o que corresponde a quase 4%  dos casos de câncer nessa população,  e a oitava no Brasil, com taxa de 3% dos  casos. Em termos de mortalidade, é a  quinta causa de óbito por câncer nas  mulheres nos Estados Unidos – quase  50% das mortes por câncer na mulher são decorrentes da neoplasia ovariana.

Segundo a Estimativa 2023 do Instituto Nacional do Câncer, o número de casos novos  de câncer de ovário será de 7.310 por ano  durante o período de 2023 a 2025, indicando risco estimado de 6,62 casos novos por  100 mil mulheres. Quanto às taxas de mortalidade na população brasileira, em 2020  foram registrados 3.920 óbitos por essa  neoplasia, o que corresponde a 3,62 óbitos  por 100 mil mulheres.

Tumores malignos do ovário podem  ocorrer em qualquer faixa etária. Os de  origem epitelial são os mais frequentes,  correspondem a cerca de 90% dos  tumores e ocorrem principalmente após  a menopausa. Em pacientes com menos  de 20 anos, predominam os tumores  de células germinativas, enquanto  os tumores borderline acometem as mulheres na faixa etária de 30 a 40 anos.

A história familiar é um importante fator de risco para  câncer de ovário, especialmente nos casos de mulheres  com dois ou mais parentes de primeiro grau com  câncer de ovário ou de mama, bem como a presença de  mutações nos genes BRCA1 e BRCA2. O risco de câncer  de ovário nessa situação pode chegar a quase 50%. A  síndrome de Lynch, outra síndrome de predisposição  hereditária ao câncer, também é um importante fator de  risco de câncer de ovário, associada ao risco de 3% a 14%  de neoplasia ovariana.

Outros fatores de risco incluem a idade (maior prevalência  na sexta e sétima décadas de vida), a nuliparidade, terapia  hormonal no climatério, doença inflamatória pélvica e endometriose. Os fatores de proteção são o uso de contraceptivos orais, primeira gravidez em idade menor que 25  anos, amamentação e ligadura das trompas.

Pela ausência de sintomas específicos quando  o câncer de ovário está no seu estágio inicial,  o diagnóstico, na maioria das pacientes, é feito  quando a doença encontra-se em estágios mais  avançados – 65% dos casos estão nos estádios  III ou IV, com taxa de cura de somente 18%.  Não há recomendações para o rastreamento  na população geral assintomática que não  apresenta risco aumentado dessa neoplasia e,  nas pacientes de alto risco, algumas diretrizes  sugerem a realização de ultrassonografia  transvaginal e da dosagem sérica de CA-125,  associadas ao exame físico. No entanto, ainda  não há comprovações de que essa estratégia  diminua os índices de mortalidade pelo câncer  de ovário. Cumpre destacar, entretanto, que a  avaliação por um oncogeneticista é indicada sempre que possível, principalmente nas  parentes não afetadas de pacientes portadoras de neoplasias epiteliais não mucinosas de  ovário. De qualquer modo, a decisão de realizar  esses testes deve ser tomada em conjunto  entre médico e paciente.

Outro marcador que pode ser utilizado para  indicar a probabilidade de malignidade é o HE4,  ou human epididymis protein 4, uma glicoproteína  expressa em tumores ovarianos de linhagem  epitelial, não sendo produzido pelo epitélio  ovariano normal. Alguns estudos mostraram  que o HE4 apresentou maior especificidade que  o CA-125 em detectar o câncer de ovário. Uma  metanálise de 18 estudos encontrou sensibilidade  agrupada de 81% e especificidade agrupada de  91% no diagnóstico de câncer de ovário (Huang  et al, 2018). O marcador está presente em até  100% dos adenocarcinomas endometrioides, em  93% dos adenocarcinomas serosos e em 50% dos  carcinomas de células claras, embora não seja  encontrado em tumores mucinosos.

De modo semelhante ao que ocorre com o  CA-125, o HE4 aparece aumentado em mais de 80% das pacientes com câncer de ovário.

A dosagem do HE4 pode também ser  utilizada na avaliação do risco para tumores  ovarianos em mulheres portadoras de massa  anexial previamente à intervenção cirúrgica.  Nessa condição, a análise conjunta com  a dosagem do CA-125 é recomendada. O  índice ROMA, ou Risk for Ovarian Malignancy  Algorithm, configura uma ferramenta que auxilia a estratificação de risco de câncer  de ovário em grupos de baixo e alto risco, considerando o CA-125, o HE4 e o status  menopausal, conforme descrito a seguir.



As dosagens de HE4 e CA-125 são ainda úteis no acompanhamento de pacientes com diagnóstico prévio  de tumor epitelial do ovário, servindo como um indicador de recidiva. Valores elevados de HE4 também  podem ocorrer em neoplasias não ovarianas, como tumores de pulmão, pâncreas e mama, bem como  em doenças benignas, como a endometriose. Nas pacientes com endometrioma de ovário, suspeita  de câncer de ovário e achados inconclusivos na ultrassonografia, o HE4 também se mostrou útil no diagnóstico (Rius et al, 2021).

Destaca-se que um resultado dentro do intervalo de referência não afasta a possibilidade de câncer,  da mesma forma que valores elevados não devem ser interpretados como neoplasia maligna.  O HE4 não deve ser utilizado para o monitoramento de pacientes com câncer de ovário mucinoso ou de  linhagem germinativa, nem para o rastreamento populacional de tumor de ovário. O valor de referência  do HE4 é de até 150 pmol/L.


Referências bibliográficas: 

1. ACOG. The role of the obstetrician–gynecologist in the early detection of epithelial  ovarian cancer in women at average risk. Committee Opinion n. 716, September 2017. 

2. Anton C, Carvalho FM, Oliveira EI, Maciel GA, Baracat EC, Carvalho JP. A comparison  of CA125, HE4, risk ovarian malignancy algorithm (ROMA), and risk malignancy index  (RMI) for the classification of ovarian masses. Clinics (Sao Paulo). 2012;67(5):437-41. 

3. Huang J, Chen J, Huang Q. Diagnostic value of HE4 in ovarian cancer: a metaanalysis. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2018;231:35-42. 

4. Lof P, van de Vrie R, Korse CM, van Gent MDJM, Mom CH, Dunné FMFR, et al. Can  serum human epididymis protein 4 (HE4) support the decision to refer a patient with  an ovarian mass to an oncology hospital? Gynecol Oncol. 2022;166:284-91

5. Rius M, Fusté P, Ros C, Martínez-Zamora A, deGuirior C, Gracia M,  et al. HE4 might be a more useful tumor biomarker to detect malignancy in  patients with ovarian endometrioma when malignancy is suspected. J Int Nat  Res. 2021;49:1-9. 

6. Silva Filho AL et al. Câncer de ovário e tubas uterinas. In: Fernandes & Sá.  Tratado de Ginecologia Febrasgo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019.  p. 887-96. 

7. Silva Filho AL, Moretti-Marques R, Carvalho JP. Febrasgo Position Statement.  Adnexal mass: diagnosis and management. Number 1 - July 2020. p.438-44.  Doi: https://doi.org/10.1055/s-0040-1715547


Consultoria médica:

Dr. Gustavo Arantes Rosa Maciel 

Consultor médico em Ginecologia e Biologia Molecular

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Dr. Ismael D. Cotrim Guerreiro da Silva 

Consultor médico em Ginecologia e Biologia Molecular 

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