Lesões osteocondrais do domus talar

Avaliação por imagem no diagnóstico dessas lesões é fundamental.

As lesões osteocondrais do domus talar consistem em  uma doença multifatorial da cartilagem articular e do  osso subcondral e podem resultar em dor persistente no  tornozelo e osteoartrose. 

Juntamente com o exame físico e a história clínica, uma  avaliação por imagem desempenha papel essencial no  diagnóstico dessas lesões e é fundamental para a tomada de decisões de tratamento e determinação do prognóstico,  fornecendo informações sobre o tamanho, localização  e status da cartilagem e do osso subcondral, bem como lesões associadas e alterações degenerativas.

HISTÓRIA NATURAL DAS LESÕES  OSTEOCONDRAIS DO DOMUS TALAR 

Os entorses de tornozelo possuem incidência de  2,15 por 1.000 pessoas/ano, sendo que a maior  parte das lesões osteocondrais são decorrentes de  eventos pós-traumáticos, e até 6,5% dos entorses  de tornozelo resultam em lesões osteocondrais.

Após o trauma, o principal mecanismo inicial é a lesão  da cartilagem devido ao estresse de cisalhamento. O  trauma pode causar descontinuidades da cartilagem  de revestimento que permitem a insinuação de fluido  articular no local da lesão, promovendo osteólise  e formação de cistos subcondrais, resultando na  progressão da própria lesão condral.  

O trauma de alto impacto também pode causar  microfraturas subcondrais diretas e impactação  óssea, dificultando a sustentação da cartilagem  pelo osso subcondral, podendo levar a instabilidade  e consequentes lesões condrais. O ciclo patológico  se traduz clinicamente como dor profunda no  tornozelo com ou sem edema, que piora com a  sustentação de peso e atividade, com possível  instabilidade articular associada.

Se não forem tratadas, as lesões osteocondrais  podem causar dor persistente em até 14% dos  pacientes e atividades diárias ou esportivas limitadas  em aproximadamente 23% e 58% dos pacientes,  respectivamente, com baixa taxa de progressão  para osteoartrose. Algumas lesões osteocondrais  cicatrizam ou permanecem inalteradas e são  assintomáticas, e a regressão completa da lesão foi  relatada, especialmente em crianças.

AVALIAÇÃO POR IMAGEM 

A radiografia simples é o método mais utilizado na  avaliação por imagem inicial do tornozelo devido  à sua ampla disponibilidade e baixo custo. No  entanto, de 30% a 50% das lesões osteocondrais  do domus talar podem não ser visualizadas por  este método, principalmente se estiver localizada  posteriormente. Além disso, a radiografia simples não consegue determinar com precisão a localização e a  extensão da lesão osteocondral, achados importantes na  definição do tratamento e prognóstico.

A tomografia computadorizada (TC) é outro método de  imagem que pode ser utilizado na avaliação das lesões  osteocondrais, com sensibilidade e especificidade de  até 81% e 99%, respectivamente. É o método mais  preciso para mensurar as lesões e avaliar a placa óssea  subcondral, no entanto, possui avaliação limitada no que  se refere ao estado da cartilagem, edema da medular  óssea e lesões de tecidos moles associadas.

A ressonância magnética (RM) é o método mais adequado  para o diagnóstico de lesões osteocondrais com sensibilidade e especificidade de 96%. Embora a avaliação da cartilagem do tornozelo seja desafiadora devido à sua pequena  espessura, curvatura e congruência articular, a RM permite a  identificação de lesões e degenerações da cartilagem, principalmente com campos magnéticos de 1.5 Tesla e 3.0 Tesla.

Este método permite uma avaliação global da lesão  osteocondral, como a sua localização, extensão, status da  cartilagem de revestimento e do osso subcondral, além da avaliação da viabilidade do fragmento ósseo, alterações  degenerativas do tornozelo associadas e a integridade  das estruturas ligamentares.

As sequências volumétricas 3D na RM representam  um avanço tecnológico relativamente recente nesse  contexto e vêm sendo utilizadas em pacientes selecionados. Este tipo de aquisição, com cortes finos e  sem espaçamento, possibilitam detectar pequenas  lesões osteocondrais, sem efeito de volume parcial,  permitindo um diagnóstico mais preciso e melhor tratamento para o paciente.

O mapeamento em T2 é uma técnica avançada na  RM que pode ser utilizada na prática clínica em casos  selecionados. Este tipo de aquisição de imagem traduz  as modificações bioquímicas da cartilagem, permitindo a  identificação de alterações sutis e caracterizando melhor  o tecido de reparo após a cirurgia. 

A artrografia realizada por tomografia computadorizada é um método com alto contraste e resolução espacial. No entanto, não implica na modificação  do planejamento do tratamento na maioria dos casos e carece de informações sobre o edema medular  ósseo, além de apresentar as desvantagens de um método invasivo.

Se não forem tratadas, as lesões  osteocondrais podem causar  dor persistente em até 14% dos  pacientes e atividades diárias  ou esportivas limitadas em  aproximadamente 23% e 58%  dos pacientes, respectivamente,  com baixa taxa de progressão  para osteoartrose.

CASO 1 

Masculino, 10 anos. A radiografia mostra irregularidade óssea medial do  domus talar (seta em A). A RM demonstra lesão osteocondral no ombro  medial do tálus (pontas de seta), com leve impactação da placa óssea  subcondral e edema da medula óssea adjacente (asterisco). A cartilagem  acima da lesão era levemente irregular, sem erosões. A TC (d) mostra  fragmento não deslocado e irregularidades no leito ósseo (seta grossa).


CASO 2 

Masculino, 63 anos.  RM (a, b) e TC (c) no ombro  medial do domus talar,  com grandes áreas císticas  subcondrais (setas brancas)  circundadas por edema ósseo  (asterisco – a). Observe as  irregularidades da placa óssea  subcondral (ponta de seta – c)  e alterações de sinal condral,  sem erosões profundas (setas  tracejadas – a, b). O mapa  T2 não revelou modificação  significativa.


A ressonância  magnética é o método  mais adequado para  o diagnóstico de  lesões osteocondrais  com sensibilidade  e especificidade de  96%, permitindo uma  avaliação global da  lesão osteocondral,  como a sua localização,  extensão, status  da cartilagem de  revestimento e do  osso subcondral.

AVALIAÇÃO APÓS TRATAMENTO 

As lesões osteocondrais do domus talar podem ser  tratadas de forma conservadora ou cirúrgica. Nos pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico, a RM pode  fornecer informações importantes sobre o grau de consolidação de fragmentos osteocondrais fixados, status  do tecido reparativo nos casos de tratamento com microperfurações, maturação do implante autólogo de  condrócitos, e da integração do enxerto osteocondral.

CASO 3

Masculino, 42 anos. Radiografia (a) mostra impacção e irregularidade  cortical no ombro medial da cúpula talar (seta grossa). A TC (b) e a RM  (c e d) demonstram uma lesão osteocondral cística (setas), com edema  ósseo circundante (asterisco). Observe a importante irregularidade e  impactação da placa óssea, bem como derrame articular e artrose.


Referências: 

Guimarães JB, da Cruz IAN, Nery C, Silva FD, Ormond Filho AG, Carneiro BC,  Nico MAC. Osteochondral lesions of the talar dome: an up-to-date approach  to multimodality imaging and surgical techniques. Skeletal Radiol. 2021  Nov;50(11):2151-2168. 

van Dijk CN, Reilingh ML, Zengerink M, van Bergen CJ. Osteochondral  defects in the ankle: why painful? Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc.  2010;18(5):570–80.  

Steele J, Dekker T, Federer A, Liles J, Adams S, Easley M. Osteochondral  lesions of the talus: current concepts in diagnosis and treatment. Foot & Ankle  Orthopaedics. 2018;3:247301141877955  van Bergen CJA, Baur OL, Murawski CD, Spennacchio P, Carreira DS, Kearns  SR, et al. Diagnosis: history, physical examination, imaging, and arthroscopy:  Proceedings of the International Consensus Meeting on Cartilage Repair of  the Ankle. Foot Ankle Int. 2018;39(1_suppl):3S-8S.  

van Bergen CJ, Gerards RM, Opdam KT, Terra MP, Kerkhoffs GM. Diagnosing,  planning and evaluating osteochondral ankle defects with imaging modalities.  World J Orthop. 2015;6(11):944–53.


Consultoria Médica

Dr. Alípio Gomes Ormond Filho 

Coordenador do Centro Avançado de  Diagnóstico por Imagem Osteomolecular

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Dra. Isabela Azevedo Nicodemos da Cruz 

Consultora médica no Centro Avançado de  Diagnóstico por Imagem Osteomolecular

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Dr. Lucas Nakasone Matos da Silva 

Consultor médico no Centro Avançado de Diagnóstico por Imagem Osteomolecular

[email protected]