A trombectomia mecânica tem reduzido significativamente a morbidade e a mortalidade dos pacientes com acidente vascular cerebral isquêmico agudo (AVCI) secundário à oclusão de grandes vasos.
Após excluídas as contraindicações para o tratamento da condição por meio da tomografia computadorizada de crânio, a realização da angiotomografia computadorizada configura o próximo passo para identificar a oclusão, permitindo, assim, decidir se o paciente é ou não elegível ao procedimento endovascular1.
Estudos mostram que 40-60% dos pacientes com oclusão da artéria carótida interna (ACI) intracraniana não apresentam contrastação do segmento extracraniano desse vaso. Em 46% dos casos, a não contrastação da ACI cervical se deve a uma oclusão verdadeira, causada por aterosclerose do bulbo carotídeo, dissecção ou trombo cervical2. Os outros 54% decorrem de um fenômeno hemodinâmico conhecido como pseudo-oclusão3.
Presente em 6% a 15% de todos os casos de AVCI, a pseudo-oclusão é um fenômeno comum4,5. Ocorre quando um trombo obstrui a luz da ACI intracraniana, levando a uma estagnação do fluxo na ACI cervical2 . Nessa situação, não existe, de fato, uma lesão obstrutiva no segmento cervical, mas apenas um impedimento da vazão do fluxo pela oclusão intracraniana, o que gera a não contrastação da ACI cervical numa fase precoce, ou seja, arterial, do contraste. Na arteriografia, por sua vez, é possível identificar fluxo nesses vasos após cateterização seletiva4.
A diferenciação entre oclusão verdadeira e pseudo- -oclusão tem impacto no planejamento terapêutico e na questão do tempo. Nas oclusões verdadeiras, afinal, o procedimento é mais longo, já que requer angioplastia e possível colocação de stent, podendo, portanto, exceder o período da janela terapêutica6.
Como distinguir a oclusão verdadeira da pseudo-oclusão?
| A angiotomografia permite definir se estamos diante de uma oclusão ou pseudo-oclusão. Para concluir que a não contrastação da ACI cervical num contexto de AVCI se deve a uma pseudo- -oclusão, três critérios devem ser preenchidos: 1. Oclusão da ACI intracraniana, mais comumente no nível do T carotídeo (figura 1A). 2. Presença de padrão de falha de enchimento com morfologia em “chama de vela” (chamado de beak pattern) na ACI: logo após a bifurcação, observa-se um afilamento gradual antes de haver a parada da contrastação4. A especificidade desse critério aumenta para 100% diante da identificação conjunta de uma redução gradual na intensidade da contrastação desse segmento do vaso, ou seja, quanto mais cranial, menos intenso é o contraste5 (figura 1B e 1C). 3. Reenchimento da ACI cervical numa fase mais tardia do contraste5 (figura 1D). Uma vez que o padrão em “chama de vela” não é específico para pseudo-oclusão e pode também estar presente nas dissecções cervicais4, a correta diferenciação entre tais casos exige a caracterização de enchimento da ACI cervical numa fase mais tardia do contraste. Dessa forma, nos pacientes com AVCI agudo, não apenas a fase arterial da angiotomografia deve ser feita, mas também a venosa, tardia (15 segundos), ou mesmo o estudo dinâmico, já que ambos possibilitam caracterizar o fluxo lento, aumentando significativamente a chance de identificar o reenchimento da ACI cervical nos casos de pseudo-oclusão7 . |
| Diagnóstico de pseudo-oclusão Na figura 1, a morfologia do segmento proximal da ACI cervical, logo após o bulbo, foi avaliada. O padrão “chama de vela” teve alta acurácia para reconhecer a pseudo-oclusão. Figura 1. Neste caso de AVCI agudo, observa-se, no plano coronal, oclusão do T carotídeo (seta em A). No plano sagital (B), não há contrastação de toda a artéria carótida interna (ACI) direita cervical e a interrupção do fluxo é antecedida por afilamento gradual (“chama de vela”) e redução gradual da atenuação do contraste (seta em B). As imagens C e D mostram cortes axiais no mesmo nível, sendo o C na fase arterial e o D na fase venosa. As setas mostram que a ACI direita não apresentava contrastação na fase arterial e passou a apresentar enchimento na fase venosa (tardia). |
| Diagnóstico de oclusão verdadeira Na figura 2, o padrão reto, chamado de flat, tem especificidade de 100% para determinar a oclusão verdadeira5. Figura 2. Neste caso, há interrupção proximal e abrupta da ACI cervical logo após a emergência, o que é chamado de padrão flat, avaliado no plano sagital. |
Consultoria Médica em Neuroimagem
Dra. Cláudia da Costa Leite - [email protected]
Dra. Germana Titoneli dos Santos - [email protected]
Dr. Leandro Tavares Lucato - [email protected]
Dra. Milena Krieck Farche - [email protected]
Referências
1. Fernández-Gómez M, Zitan-Saidi L, Gallo-Pineda F, Hidalgo- -Barranco C, Castro-Luna G. Single vs. Multiphase Computed Tomography angiography in acute internal carotid artery occlusion: An accuracy and interobserver agreement study. Clin Imaging. 2023 Oct;102:60-64. doi: 10.1016/j.clinimag.2023.07.005. Epub 2023 Aug 11. PMID: 37595353.
2. Grossberg JA, Haussen DC, Cardoso FB, Rebello LC, Bouslama M, Anderson AM, Frankel MR, Nogueira RG. Cervical Carotid Pseudo-Occlusions and False Dissections: Intracranial Occlusions Masquerading as Extracranial Occlusions. Stroke. 2017 Mar;48(3):774-777. doi: 10.1161/STROKEAHA.116.015427. Epub 2017 Jan 24. PMID: 28119435.
3. Ni H, Yang T, Jia Z, Shi H, Liu S, Zhao L. Outcomes in acute ischemic stroke patients undergoing endovascular thrombectomy: Cervical internal carotid artery pseudo-occlusion vs. true occlusion. Front Neurol. 2023 Jan 9;13:1106358. doi: 10.3389/fneur.2022.1106358. PMID: 36698876; PMCID: PMC9868848.
4. Kappelhof M, Marquering HA, Berkhemer OA, Borst J, van der Lugt A, van Zwam WH, Vos JA, Lycklama À Nijeholt G, Majoie CBLM, Emmer BJ; MR CLEAN Investigators. Accuracy of CT Angiography for Differentiating Pseudo-Occlusion from True Occlusion or HighGrade Stenosis of the Extracranial ICA in Acute Ischemic Stroke: A Retrospective MR CLEAN Substudy. AJNR Am J Neuroradiol. 2018 May;39(5):892-898. doi: 10.3174/ajnr.A5601. Epub 2018 Apr
5. PMID: 29622556; PMCID: PMC7410653. 5. Kim H, Kwak HS, Chung GH, Hwang SB. Differentiating pseudoocclusion from true occlusion of proximal internal carotid artery in acute ischemic stroke on CT angiography. Clin Neurol Neurosurg. 2019 Oct;185:105495. doi: 10.1016/j.clineuro.2019.105495. Epub 2019 Aug 19. PMID: 31470360.
6. Poppe AY, Jacquin G, Roy D, Stapf C, Derex L. Tandem Carotid Lesions in Acute Ischemic Stroke: Mechanisms, Therapeutic Challenges, and Future Directions. AJNR Am J Neuroradiol. 2020 Jul;41(7):1142-1148. doi: 10.3174/ajnr.A6582. Epub 2020 Jun 4. PMID: 32499251; PMCID: PMC7357657.
7. Choi JH, Jang J, Koo J, Ahn KJ, Sam Shin Y, Kim BS. Multiphasic Computed Tomography Angiography Findings for Identifying Pseudo-Occlusion of the Internal Carotid Artery. Stroke. 2020 Aug;51(8):2558-2562. doi: 10.1161/STROKEAHA.120.029512. Epub 2020 Jun 26. PMID: 32586224.
Ginecologista, o relógio biológico de sua paciente está correndo.
Saiba como contornar os desafios na interpretação dos resultados da dosagem de prolactina
Strain atrial: uma nova ferramenta clínica para avaliação da função cardíaca
Nirsevimabe ajuda a prevenir a infecção e complicações causadas pelo VSR em lactentes