Papel do laboratório na reprodução assistida: da identificação do fator de agravo até o tratamento

Papel do laboratório na reprodução assistida: da identificação do fator de agravo até o tratamento

À medida que a população evoluiu, o potencial de fertilidade dos casais veio sofrendo prejuízos ao longo dos anos por influência de vários fatores, que envolvem aspectos culturais, comportamentais, sociais e biológicos. A partir da década de 1950, vários países industrializados e desenvolvidos começaram a ver sua taxa de fecundidade por mulher cair progressivamente, a maioria, inclusive, atingindo índices abaixo de 2 nascidos vivos, ritmo insuficiente para a manutenção do crescimento vegetativo. Hoje, somando a taxa global de fecundidade por mulher dos países industrializados e dos não industrializados, chega-se a um índice médio de 2,5. Considerando a idade da primeira gravidez, dados norte-americanos mostram que mais mulheres acima de 25 anos começaram a ter seu primeiro filho em comparação ao início dos anos 2000. A média de idade na primeira gestação aumentou de 21,4 anos, em 1970, para 25 anos, em 2006. 

As mudanças socioculturais advindas do estilo de vida moderno impactam diretamente o planejamento familiar, com a postergação da primeira gravidez. Contudo, a fertilidade de um casal pode ser influenciada pelo potencial reprodutivo final do indivíduo e pela presença de doenças envolvidas na etiologia da infertilidade, prevalentes nos casais em idade reprodutiva. O efeito na fertilidade pode ser maior à medida que a idade da população feminina aumenta e com o possível agravamento de doenças ginecológicas, como miomas e endometriose, em especial na quarta década de vida. 

Tanto homens quanto mulheres podem ser expostos aos mais diversos fatores de agravo à fertilidade desde a vida intrauterina. Vários aspectos ambientais e relacionados ao estilo de vida são capazes de interferir negativamente na fertilidade da população em geral. O meio ambiente e as mudanças no estilo de vida da população mundial nas últimas seis décadas, ao mesmo tempo em que facilitaram a vida de homens e mulheres em diferentes contextos, trouxeram alguns efeitos colaterais indesejáveis. Sedentarismo, obesidade, alimentos industrializados, drogas sintéticas (lícitas e ilícitas), contato com agrotóxicos e pesticidas, poluição ambiental e irradiações eletromagnéticas provocam impactos negativos sobre a fertilidade. A maioria desses fatores é modificável e, portanto, o ginecologista e o urologista conseguem realizar o aconselhamento e atuar na prevenção primária de várias doenças, protegendo o potencial reprodutivo do casal, prolongando a fertilidade e aumentando as chances de sucesso de um tratamento de reprodução assistida. 

Fatores de agravo à fertilidade masculina 

De 25% a 35% dos casos de infertilidade conjugal são ocasionados exclusivamente pelo fator masculino. Entre as doenças orgânicas que afetam a fertilidade masculina, a varicocele é a mais frequente e a mais relevante causa tratável de infertilidade masculina. A dilatação das veias do plexo pampiniforme está por trás de 40% dos homens com diagnóstico de infertilidade primária e de até 80% daqueles com infertilidade secundária. A hipertermia crônica gerada pela varicocele gera um aumento do metabolismo, que, por usa vez, acarreta um aumento de radicais livres e estresse oxidativo. A perda quantitativa e qualitativa na produção de espermatozoides é a responsável pela redução de fertilidade.

O tumor de testículo e a criptorquidia também podem se associar com infertilidade masculina. Homens inférteis têm risco 20 vezes maior de desenvolver esse tumor do que os da população geral. Em pacientes com criptorquidia unilateral, a incidência de azoospermia é de 15%, chegando a 60-70% em casos bilaterais não tratados. 

As alterações genéticas respondem por grande parcela desses casos e influenciam vários processos fisiológicos, como a homeostasia, a espermatogênese e a qualidade espermática. A principal alteração cromossômica em homens azoospérmicos é a síndrome de Klinefelter. Outras mutações genéticas incluem as translocações robertsonianas, encontradas em até 2,5% da população em homens inférteis, e a microdeleção de cromossomo Y, presente em até 15% dos homens azoospérmicos e oligozoospérmicos com produção de até 1 milhão de espermatozoides por mililitro. 

Entre as infecções e inflamações do trato reprodutivo masculino, a infecção pela Neisseria gonorrhoeae pode ocasionar estenose uretral no homem e prejudicar o funcionamento testicular até dois anos após o acometimento. Bactérias atípicas, como clamídia, micoplasma e ureaplasma, também são uma grande causa de infertilidade masculina – e feminina –, levando ao risco de uma orquiepididimite bacteriana. Já a infecção pelo vírus da caxumba acomete os testículos em até 40% dos casos e cerca de 50% dos testículos acometidos progridem para algum grau de atrofia dentro do primeiro ano de infecção. Outros vírus ainda podem prejudicar a espermatogênese, como Epstein-Barr, HIV, influenza, Coxsackie vírus e, mais recentemente, Sars-CoV-2. 

Ambiente e estilo de vida 

Quanto ao estilo de vida e a fatores ambientais, o efeito sobre a espermatogênese pode ocorrer ainda durante a vida perinatal. Os hábitos maternos e os fatores de agravo diversos não raro produzem consequências irreversíveis para a espermatogênese na vida adulta do filho, especialmente pela redução do número de células de Sertoli e, por conseguinte, das espermatogônias. Contudo, na fase de maturidade sexual, que é um período de maior complacência, os efeitos adversos poderiam potencialmente ser revertidos após o término da exposição.

A obesidade apresenta importante impacto negativo na quantidade e na qualidade da espermatogênese, com prejuízo do resfriamento testicular, acarretando hipertermia testicular crônica e, consequentemente, produção excessiva de radicais livres de oxigênio e estresse oxidativo, além de taxa maior de fragmentação de DNA espermático e prejuízo do funcionamento do eixo hipotálamo-hipófise-testicular. 

Substâncias tóxicas presentes no cigarro acometem a produção de espermatozoides de forma direta e indireta, com depósito de chumbo e cádmio no parênquima testicular, gerando ação citotóxica local e catalisando as reações de estresse oxidativo em doenças como a varicocele. Os efeitos sobre o espermatozoide incluem redução da concentração, da motilidade e da morfologia, aumento da fragmentação de DNA e comprometimento funcional. Entre as drogas ilícitas, o uso de maconha, cocaína e opiáceos exerce efeito negativo na produção de testosterona e na espermatogênese, reduzindo todos os parâmetros seminais. 

Quanto à radiação eletromagnética, estudos realizados in vivo ou de maneira retrospectiva mostraram efeitos negativos de telefones celulares e laptops sobre a função testicular, relacionados ao modo e ao tempo de utilização. Quanto maior o período de conversa e posse de telefone celular, menor a concentração de espermatozoides rápidos progressivos e maior a proporção de espermatozoides lentos progressivos, bem como pior o padrão da morfologia. O calor local pelo emprego de laptops junto ao corpo e sustentados no colo também pode ocasionar prejuízo à temperatura testicular. 

Por fim, estudos mostram que os homens submetidos ao contato com solventes e pesticidas ou expostos à poluição ambiental apresentam redução dos parâmetros de análise seminal, como redução da média de concentração de espermatozoides. Entretanto, as pesquisas ainda não determinaram por qual mecanismo específico de ação esses poluentes prejudicam a espermatogênese e reduzem o potencial de fertilidade.

Fatores de agravo à fertilidade feminina 

Causas femininas exclusivas de infertilidade justificam de 30% a 40% dos casos de infertilidade conjugal e são representadas por doenças que afetam a ovulação, problemas uterinos e tuboperitoneais, alterações genéticas, fatores ambientais e estilo de vida. 

Os distúrbios ovulatórios estão por trás de 20% a 30% dos casos de infertilidade feminina. A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é, atualmente, a doença endócrina mais comum em mulheres jovens e justifica 70% dos casos de infertilidade de causa ovulatória. Em pacientes com SOP, a falta de fertilidade está relacionada com anovulação crônica e com maior incidência de abortamentos, além de estar associada à obesidade e à síndrome metabólica em 50% dos casos. 

A insuficiência ovariana prematura (IOP), definida pela perda da atividade ovariana antes dos 40 anos de idade, tem prevalência de 1% na população geral e se caracteriza por alterações menstruais, com gonadotrofinas elevadas e baixos níveis de estradiol (hipogonadismo hipergonadotrófico). Outras causas de anovulação incluem a hiperprolactinemia, disfunções tiroidianas (como hipotiroidismo) e hiperplasia adrenal congênita forma tardia. 

O fator cervical, por sua vez, constitui causa pouco frequente de infertilidade (menos de 3% dos casos) e está representado principalmente por anormalidades anatômicas, sobretudo estenoses, em geral decorrentes de infecções ou traumas de tratamentos cirúrgicos prévios. As doenças uterinas podem comprometer os diferentes níveis da fisiologia da reprodução e, consequentemente, provocar infertilidade. Observam-se miomas uterinos em cerca de 5% a 10% das pacientes inférteis, que são os causadores únicos da infertilidade em 1% a 3% dos casos. Os miomas podem comprometer anatomicamente a cavidade uterina e alterar a contratilidade e a vascularização do útero, reduzindo as taxas de gravidez, implantação e nascidos vivos. Os efeitos sobre a fertilidade feminina são mais relevantes quando seu diâmetro supera 5 cm.

Pólipos endometriais podem ser encontrados em cerca de 15% a 24% das mulheres inférteis e é possível que causem infertilidade por interferência mecânica no transporte dos gametas e/ou embrião, bem como por comprometimento da receptividade endometrial e implantação. Na adenomiose, condição com prevalência que varia entre 20% e 30%, os mecanismos que influenciam a fertilidade incluem hiperexpressão de receptores estrogênicos, aumento local de prostaglandina E2 e estrógenos e produção excessiva de óxido nítrico e de radicais livres, que comprometem a receptividade endometrial, a implantação e a qualidade dos gametas e embriões formados.

Outras causas uterinas de infertilidade abrangem as malformações congênitas, com destaque para o septo uterino. Embora 25% das pacientes inférteis ou com abortamentos de repetição tenham útero bicorno, a maioria das mulheres com essa anomalia não tem dificuldade para engravidar. 

As aderências intrauterinas associam-se com maior incidência de falhas de implantação, abortamentos espontâneos precoces e parto prematuro. Os fatores tuboperitoneais estão presentes em cerca de 25% a 35% das mulheres com infertilidade, tendo, como causas mais frequentes, a doença inflamatória pélvica (DIP) e a endometriose. Estima-se que 12% das pacientes com DIP se tornarão inférteis após o primeiro episódio, 25% após o segundo e 50% após o terceiro. Os danos tubários após o processo infeccioso prejudicam mecanicamente o transporte de gametas e tornam o ambiente intratubário desfavorável ao desenvolvimento embrionário. 

Já a endometriose ocorre em cerca de 20% a 50% das pacientes inférteis e, entre as diagnosticadas, de 30% a 50% apresentam infertilidade. Atualmente se acredita que a dificuldade de concepção em mulheres com endometriose seja multifatorial e envolva distorção da anatomia pélvica causada pelas múltiplas aderências, prejudicando a comunicação entre tubas uterinas e ovários, alteração do fluido peritoneal com aumento da secreção de fatores proinflamatórios, de crescimento, angiogênicos e de espécies reativas de oxigênio, o que impacta tanto a motilidade espermática como sua capacitação e interação óvulo-espermatozoide. 

Assim como no homem, causas genéticas também podem ser responsáveis pela infertilidade feminina, em índices estimados em cerca de 10%. As alterações incluem anormalidades cromossômicas, anomalias na maturação sexual feminina e função reprodutiva, defeitos genéticos em vários níveis do eixo hipotálamo-hipófise-ovariano ou da biossíntese de esteroides gonadal e adrenal e possibilidade de defeitos genéticos únicos ou múltiplos em condições clínicas comuns (SOP ou IOP). Por volta de 5% das mulheres inférteis possuem alguma anormalidade cromossômica, sendo a síndrome de Turner a mais comum.



O impacto do que vem de fora 

Quanto ao estilo de vida e a fatores ambientais, a obesidade associa-se com hipersecreção do hormônio luteinizante, causando impacto na foliculogênese e quadros de anovulação, além de poder diminuir a qualidade do óvulo e do embrião, como demonstrado em estudos de tratamentos de reprodução assistida. O tabagismo altera o microambiente folicular, os níveis hormonais na fase lútea e a contratilidade das tubas uterinas, além de dificultar a penetração do espermatozoide no óvulo e aumentar o risco de abortamento em gestações naturais e após fertilização assistida. Acredita-se que o consumo moderado de álcool suprima a foliculogênese e a ovulação e tenha efeito sobre a maturação do oócito, o desenvolvimento embrionário e a implantação, elevando ainda o risco de abortamento espontâneo.

Além da possibilidade de as mulheres em idade reprodutiva serem expostas a substâncias teratogênicas no ambiente de trabalho, determinadas toxinas ambientais, como radiação, pesticidas e solventes, também têm se mostrado como fatores que podem afetar negativamente a fertilidade. 

Por fim, o fator psicológico igualmente é um potencial causador de impacto negativo sobre a fertilidade feminina. Vários estudos indicam que a infertilidade está associada com níveis elevados de estresse psicológico.

Fertilização assistida 

A infertilidade conjugal é definida como a incapacidade de um casal engravidar após o período de 12 meses com relações sexuais bem distribuídas ao longo do ciclo menstrual e desprotegidas de métodos contraceptivos. Cerca de 88% dos casais engravidam no primeiro ano de tentativas. Portanto, aproximadamente 15% dos homens e mulheres em idade reprodutiva irão, em algum momento, procurar auxílio médico para a busca da fertilidade. 

As técnicas de reprodução assistida podem ser de baixa complexidade, como coito programado ou inseminação intrauterina, que apresentam taxas de sucesso de até 30%, ou de alta complexidade, que incluem os tratamentos de fertilização in vitro clássica e a injeção intracitoplasmática de espermatozoides. Nessa categoria, em mulheres abaixo de 40 anos, as taxas de gravidez podem alcançar até 60%.

Novo Centro de Medicina Reprodutiva do Fleury abre espaço para médicos independentes

Recentemente inaugurado, o Fleury Fertilidade é um centro especializado para tratamentos de Medicina Reprodutiva, além de cirurgias focadas na fertilidade. Inédito no Brasil, o modelo foi concebido especialmente para receber os médicos independentes e seus pacientes para a realização de procedimentos relacionados à Reprodução Humana, em um espaço que oferece o mais alto padrão de qualidade em equipamentos, infraestrutura e segurança, bem como o acolhimento e a qualidade do atendimento que caracterizam o Fleury. O espaço conta com um laboratório de embriologia com alta tecnologia e duas salas cirúrgicas para a realização de procedimentos femininos e masculinos, de modo a permitir que os pacientes façam todas as etapas do tratamento em um só lugar.

Veja o que pode ser feito no Fleury Fertilidade

Procedimentos laboratoriais:  

  • Fertilização in vitro (FIV) 
  • Injeção intracitoplasmática de espermatozoides (ICSI) 
  • Processamento seminal para inseminação intrauterina 
  • Técnicas de seleção de espermatozoides com baixa fragmentação 
  • Biópsia de embrião

Procedimentos: 

  • Inseminação intrauterina (IIU) 
  • Captação folicular  Transferência de embriões 
  • Correção cirúrgica de varicocele com microscópio 
  • Reversão de vasectomia com microscópio 
  • Vasectomia
  •  Biópsia de endométrio 
  • Colocação e retirada de DIU

Obtenção de espermatozoides: 

  • Obtenção cirúrgica: MESA* e TESE* 
  • Obtenção por punção aspirativa: PESA* / TESA* 
  • Obtenção cirúrgica: microdissecção testicular

Criopreservação: 

  • Congelamento de oócitos 
  • Congelamento de sêmen 
  • Congelamento de embriões 
  • Congelamento de tecido ovariano 
  • Congelamento de tecido testicular


*Em inglês: 

Microsurgical Epididymal Sperm Aspiration (MESA) 

Testicular Sperm Extraction (TESE) 

Percutaneous Epididymal Sperm Aspiration (PESA)  

Sperm Aspiration (TESA)


Consultoria Médica:

Dr. Daniel Suslik Zylbersztejn 

[email protected]