O CASO
Menina de 8 anos e 6 meses foi encaminhada para a realização de ultrassonografia pélvica com estudo dopplerfluxométrico das artérias uterinas para avaliação do desenvolvimento puberal dos órgãos pélvicos. Clinicamente, apresentava brotos mamários e pelos pubianos discretos. A mãe referiu que, durante o período da pandemia de Covid-19, percebeu um aumento significativo no peso da filha.
DISCUSSÃO
O acompanhamento clínico do desenvolvimento puberal tem se tornado cada vez mais frequente, possibilitando o diagnóstico precoce das meninas que ingressaram nesse processo e tenham necessidade de intervenção medicamentosa ou, eventualmente, cirúrgica.
A depender do caso, esse seguimento é feito com dados clínicos, havendo, por vezes, necessidade de complementação com exames laboratoriais e de imagem, como ressonância magnética, radiografia simples e ultrassonografia. Entre os métodos de imagem mais frequentemente solicitados no manejo desse grupo estão a radiografia das mãos e punhos e a ultrassonografia pélvica.
Atualmente, as meninas estão experimentando o ingresso na puberdade de forma mais precoce em relação aos anos passados. Ademais, nesta fase da pandemia, tem se observado um amadurecimento puberal mais acentuado em algumas meninas e/ou ganho de peso, o qual, particularmente, pode mimetizar o aparecimento de brotos mamários, um dos sinais da iminência da puberdade.
A atenção para com a precocidade da puberdade se justifica pela possibilidade de diagnosticar alguma eventual condição patológica que tenha antecipado esse processo, como cistos ovarianos, distúrbios nas adrenais e doenças do sistema nervoso central, assim como de retardar o processo, após o diagnóstico adequado dessa situação, permitindo uma manutenção na curva de crescimento e postergando o aparecimento da menacme em uma criança muito jovem.
Definição de puberdade precoce
Considera-se puberdade precoce o início do desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos, nas meninas, e antes dos 9 anos, nos meninos. O processo de desenvolvimento normal dos caracteres sexuais secundários inicia-se a partir da maturidade do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal e do aumento da produção de androgênios pelas glândulas suprarrenais. Em geral, a puberdade ocorre entre 8 e 13 anos de idade, nas meninas, e dos 9 aos 14 anos, nos meninos. No sexo feminino, começa com a telarca, seguida da pubarca, do aceleramento do crescimento linear e da menarca, que se dá cerca de dois anos após o surgimento do broto mamário. Já nos meninos, tudo se inicia com o aumento dos testículos (gonadarca), acompanhado pela pubarca e pelo crescimento linear.
A puberdade precoce é classificada em central, dependente de gonadotrofinas, e periférica, não dependente de gonadotrofinas. A primeira tem causas genéticas, tumores do sistema nervoso central e alterações do sistema nervoso central, como malformações e infecções. Afastadas essas causas, é definida como puberdade precoce idiopática, observada em 90% dos casos no sexo feminino. Já a puberdade precoce periférica deriva de mutações genéticas, tumores (adrenal, ovário, testicular), hiperplasia adrenal congênita, cisto ovariano, hipotiroidismo primário e exposição exógena a estrogênio ou testosterona.
Há também as variantes normais do desenvolvimento puberal, que constituem um processo benigno e autolimitado, no qual a telarca, a pubarca ou a menarca podem se desenvolver isoladamente, sem que haja outros sinais de maturação sexual.
O gênero e a origem étnica influenciam o aparecimento da puberdade precoce, tanto é assim que se observa prevalência maior nas meninas em comparação aos meninos (cerca de 10 a 20 vezes maior), bem como nos afrodescendentes.
A baixa estatura na idade adulta configura a principal consequência clínica da precocidade sexual, caso não se institua o tratamento no momento adequado.
Diante da suspeita de puberdade precoce central, é imprescindível proceder a uma investigação cuidadosa de sua etiologia, uma vez que, ainda que a maior parte dos casos seja idiopática, 10% deles estão associados com doenças do sistema nervoso central.
Ultrassonografia pélvica
O uso da ultrassonografia pélvica para a avaliação do desenvolvimento pélvico em meninas é comum na prática clínica. Por se tratar de um método de imagem indolor, sem radiação e não invasivo, pode ser utilizado em crianças e repetido sempre que necessário.
Na prática, o exame permite caracterizar a morfologia uterina, que sofre modificações de acordo com a fase de desenvolvimento em que a menina se encontra, apresentando padrões distintos no período neonatal, na infância, na fase pré-puberal, na fase puberal e na fase adulta. A realização do estudo por profissionais experientes possibilita a caracterização de estruturas por vezes muito pequenas, ainda não desenvolvidas como em adultas.
No contexto da puberdade precoce, o método avalia as estruturas dos órgãos pélvicos, bem como a definição do estágio em que se desenvolvem, além de descartar eventuais doenças associadas à antecipação do processo puberal, como os cistos ovarianos. A complementação com a dopplerfluxometria das artérias uterinas fornece uma avaliação adicional das características uterinas.
Além disso, o exame serve para acompanhar as meninas que estejam em vigência de uso de medicamento para bloqueio hormonal, demonstrando a eficácia ou não do tratamento.
CONCLUSÃO
A utilização da ultrassonografia pélvica tem se mostrado uma ferramenta bastante útil na avaliação do desenvolvimento puberal das meninas. O exame caracteriza os órgãos pélvicos, auxiliando o pediatra e o endocrinopediatra, juntamente com os dados clínicos e de outros exames, a definir a melhor conduta a ser instituída.
Referências bibliográficas
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CONSULTORIA MÉDICA
Dra. Lisa Suzuki
Dra. Marcia Wang Matsuoka
Dra. Silvia Maria Sucena da Rocha
Dr. Rodrigo Regacini
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