Tomografia computadorizada no paciente com angina estável

Método vê a luz e a parede das coronárias, podendo identificar a presença de placas de ateroma


A tomografia das artérias coronárias é um exame não invasivo que utiliza radiação ionizante e meio de contraste iodado para reproduzir a anatomia do coração e, em especial, as artérias coronárias, com o objetivo principal de documentar se há ou não algum comprometimento dessas estruturas.

Sua maior contribuição é determinar se há ou não aterosclerose nesses vasos, o que permite a correta estratificação de risco e a melhor tomada de decisão clínica quanto ao melhor tipo de tratamento para cada paciente. A tomografia torna possível visualizar tanto a luz como a parede das artérias coronárias (figura 1), revelando com elevado grau de acurácia se existem ou não placas de ateroma que possam ser responsáveis pelos sintomas que o paciente apresente. Por essas características, suas indicações clínicas se baseiam nesse aspecto, conforme pode ser depreendido a partir da análise das diretrizes de uso da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que descreveremos a seguir.


Figura 1 – A tomografia computadorizada possibilita a identificação da luz arterial, bem como permite avaliar a parede do vaso com grande precisão, além de ter elevado poder preditivo negativo, permitindo excluir doença coronariana com grande segurança.


A tomografia está indicada como método inicial de avaliação de pacientes com dor torácica. Diferentes estudos demonstraram que a inclusão do exame no protocolo de avaliação de pacientes com queixa de dor torácica apresenta melhores resultados, reduzindo as coronariografias invasivas e as revascularizações. Ao mesmo tempo, o uso do exame garante outros ganhos tardios, em especial pelo emprego correto de fármacos e pela mudança de estilo de vida, que diminuem o número de infartos, como demonstrado pelo estudo Scot-Heart. Tais dados fizeram com que diferentes nações, como o Reino Unido, passassem a indicar a tomografia como forma inicial de avaliação da dor torácica (figura 2). 

Figura 2 – A qualidade das imagens da tomografia vem fazendo com que esse exame seja considerado a opção inicial para a avaliação inicial de pacientes com dor torácica. Neste exemplo, vemos as imagens de pacientes com placas significativas na artéria coronária direita (A) e na artéria descendente anterior (B) em pacientes em investigação diagnostica por apresentar dor precordial.


Já nos casos de dor torácica na sala de emergência, a maior contribuição do exame é na avaliação de pacientes com perfil de risco intermediário/baixo e baixo, nos quais não se conseguiu excluir com segurança a presença de síndrome coronariana aguda. Contudo, a tomografia não deve ser visto como uma substituta da cinecoronariografia, que permanece como o método de escolha para pacientes na sala de emergência com diagnóstico de infarto do miocárdio, mas, sim, como uma forma de avaliar pacientes de risco mais baixo, que não tiveram o diagnóstico confirmado.

Outra indicação importante do exame é a investigação de pacientes que apresentam insuficiência cardíaca ou bloqueio de ramo esquerdo de início recente. Como a doença coronariana configura a causa mais frequente de disfunção ventricular, sendo o motivo frequente de alterações da condução do estímulo elétrico, a tomografia pode demonstrar se há ou não aterosclerose coronariana nos pacientes com tais queixas e orientar o manejo desses casos. Caso não exista doença obstrutiva, deve-se proceder à investigação da etiologia do déficit da contração miocárdica com o uso de outros exames, como a ressonância magnética (figura 3).


Figura 3 – Por ser um exame capaz de excluir doença arterial coronariana ou de identificar a presença de estenoses, a tomografia pode ser utilizada para identificar doença coronariana em casos de insuficiência cardíaca de recente início. Casos de perfil de maior gravidade podem ser avaliados diretamente pela cinecoronariografia. Se a investigação excluir a presença de aterosclerose como causa da disfunção ventricular, deve-se tratar os fatores de risco e pesquisar outras causas de disfunção por meio de exames como a ressonância magnética.


Como possibilita excluir com segurança a presença de obstruções significativas, o estudo tomográfico também está indicado quando há conflito entre exames não invasivos, em especial diante de alterações sugestivas ao teste ergométrico, mesmo porque a cintilografia por medicina nuclear não revela defeitos de perfusão. Se a tomografia não apresentar estenoses, o paciente pode ser submetido a tratamento clínico para controle dos fatores de risco, sem necessidade de indicar cinecoronariografia. Já nos casos em que o exame mostra estenoses, pode-se indicar o exame invasivo com segurança (figura 4).


Figura 4 – Em casos com teste ergométrico alterado e cintilografia normal, a tomografia permite determinar se há ou não obstruções que possam ser a causa da alteração encontrada. Em outras situações, como no exemplo acima, a tomografia exclui a presença de aterosclerose coronariana, auxiliando a tomar a melhor decisão clínica sobre cada caso.


Outra indicação de tomografia incluída nas diretrizes da ANS é diante da suspeita clínica de origem anômala. Como o exame possibilita a avaliação adequada tanto das artérias coronárias como das demais estruturas cardíacas, pode identificar casos em que há origem atípica, com sinais de compressão extrínseca e que necessitam de tratamento invasivo (figura 5).

Figura 5 – Por permitir a avaliação das artérias coronárias e das demais estruturas do coração, a tomografia é um exame de excelência para a avaliação de origem anômala das artérias coronárias, como neste caso, em que a artéria coronária direita tem seu estio deslocado para a esquerda, com sinais de compressão significativa da porção proximal. O paciente foi submetido a tratamento cirúrgico.


Além das indicações acima descritas, a avaliação tomográfica tem utilidade para definir a carga aterosclerótica total, um importante fator prognóstico que, no recente estudo Ischemia, revelou-se mais relevante do que a carga isquêmica total. Pela tomografia, esse parâmetro é calculado a partir da quantificação do volume de placas em todas as artérias coronárias e pode ser facilmente incluído nos relatórios do exame.

 

A crescente contribuição da tomografia na avaliação não invasiva da doença arterial coronariana reflete o progresso tecnológico que, seguramente, será responsável por permitir melhor caracterização das placas de ateroma e favorecerá a personalização do tratamento, uma tendência hoje em diferentes áreas da medicina.


Fontes bibliográficas

II Diretriz de Ressonância Magnética e Tomografia Computadorizada Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia e do Colégio Brasileiro de Radiologia

http://www.ans.gov.br/images/stories/Particitacao_da_sociedade/consultas_publicas/cp59/dut/cp_59_04.pdf

SCOT-HEART Investigators, Newby DE, Adamson PD, et al. Coronary CT Angiography and 5-Year Risk of Myocardial Infarction. N Engl J Med. 2018;379(10):924-933. doi:10.1056/NEJMoa1805971

https://www.nice.org.uk/sharedlearning/ct-coronary-angiography

Maron DJ, Hochman JS, Reynolds HR, et al. Initial Invasive or Conservative Strategy for Stable Coronary Disease. N Engl J Med. 2020;382(15):1395-1407. doi:10.1056/NEJMoa1915922.


Consultoria médica

Dr. Ibraim Masciarelli Francisco Pinto

[email protected]