Conheça o arsenal diagnóstico disponível para a avaliação ginecológica de rotina e gestacional
Ocasionadas por bactérias, vírus e parasitas, as doenças sexualmente transmissíveis (DST) acometem mais de 1 milhão de pessoas ao dia no mundo e encontram-se entre os cinco principais motivos de consulta médica. Além do grande impacto para a saúde, algumas DST podem aumentar o risco de aquisição do HIV em três vezes ou mais, ser transmitidas ao feto durante a gestação e associar-se com desfechos perinatais desfavoráveis.
Microscopia eletrônica de transmissão evidencia o HPV, principal agente envolvido no câncer de colo uterino.
SPL DC/Latinstock
Considerada hoje a DST mais comum, a infecção por HPV atinge cerca de 80% das pessoas em algum momento da vida. Por volta de 200 tipos do vírus já foram identificados, dos quais 45 infectam o trato genital e a região anorretal. Entre os de baixo risco oncogênico, o 6 e o 11 são os mais habituais e causam sobretudo verrugas genitais. Já os de alto risco incluem os tipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59, 68, 73 e 82 e associam-se a lesões de baixo e alto graus e câncer. Praticamente 100% dos casos da neoplasia de colo do útero derivam do HPV, estando 70% deles vinculados aos tipos 16 e 18. O agente ainda responde pelos cânceres anal (90% dos casos), de vagina, vulva ou pênis (40% dos casos) e de orofaringe (10%).
Além da colpocitologia, da colposcopia e/ou vulvoscopia e da análise histopatológica, feitas para o diagnóstico da infecção subclínica e clínica, os testes biomoleculares podem ajudar a identificar a infecção latente pelo vírus em amostras de esfregaços cervicais ou de biópsia. Entre os métodos mais usuais para esse diagnóstico estão a captura de híbridos, o microarray e a hibridação in situ, assim como a PCR, convencional ou em tempo real, cuja sensibilidade fica em torno de 90% a 100%.
Já a identificação do RNA mensageiro para as oncoproteínas E6 e E7 possui sensibilidade de 60% a 85%, mas maior especificidade que os testes de DNA. A técnica detecta os cinco tipos virais mais prevalentes nas neoplasias malignas (16, 18, 31, 33 e 45) e deve ser pedida após um teste de DNA positivo para HPV de alto risco oncogênico. Sua positividade indica que o vírus está integrado ao genoma do paciente.
Testes baseados em DNA
* Células escamosas atípicas de significado indeterminado.
Pesquisa de RNA mensageiro para E6/E7 (em paciente com HPV de alto risco)
* Para identificar risco aumentado de progressão para lesão mais grave.
HIV revelado por microscopia eletrônica de transmissão.
James Cavallini/Photoresearchers/Latinstock
O diagnóstico precoce da infecção pelo HIV é fundamental para o início da terapia antirretroviral tão logo haja a confirmação. Essa estratégia visa a melhorar a qualidade de vida da mulher e implantar medidas preventivas combinadas, reduzindo o risco de transmissão do vírus, inclusive a materno-fetal.
A testagem para o HIV deve ser oferecida a todas as pacientes que procuram atendimento ginecológico, mesmo que de rotina, com periodicidade variável conforme o risco. A população mais exposta precisa ser testada pelo menos anualmente, como as mulheres que tiveram relações sexuais desprotegidas com mais de um parceiro desde a última sorologia, as que suspeitam de promiscuidade do parceiro, as profissionais do sexo, as parceiras sorodiscordantes de indivíduo HIV-positivo e as usuárias de drogas injetáveis ou parceiras de usuários.
O período entre a aquisição da infecção e a positivação dos testes pode variar entre duas semanas e três meses, dependendo da metodologia. Hoje, a maioria dos laboratórios utiliza métodos imunoenzimáticos de terceira ou quarta geração, que se tornam positivos, em média, entre três e quatro semanas de infecção. Nas pacientes que relatam exposição de risco recente ou em suspeitas de doença aguda, recomenda-se a pesquisa do RNA do vírus por PCR e a repetição da sorologia 30 dias após o primeiro teste negativo.
Doença sistêmica de etiologia bacteriana, a sífilis é causada pelo Treponema pallidum e divide-se, do ponto de vista clínico, em fases que podem ser superponíveis ou intercaladas por períodos variáveis de latência. Da mesma forma que o HIV/aids, a infecção tem de ser rastreada em pacientes assintomáticas, nas situações de exposição de risco e, sobretudo, na gestação.
As recomendações de diagnóstico variam de acordo com a fase clínica. Na primária, deve ser feita a pesquisa direta do Treponema pallidum por microscopia de campo escuro e/ou coloração pela prata do raspado da lesão. Como essa fase precede a produção de anticorpos, há possibilidade de sorologias negativas. Já a secundária caracteriza-se por altos títulos de anticorpos, que podem ser detectados por métodos que utilizam antígenos treponêmicos (FTA-Abs, ensaios imunoenzimáticos e quimioluminescentes e TP-hemaglutinação) e antígenos não treponêmicos (VDRL e RPR). É sempre necessário combinar, ao menos, duas metodologias. Embora sejam equivalentes, não se deve comparar o VDRL e o RPR, uma vez que os títulos obtidos por RPR costumam se apresentar levemente mais altos. Em grávidas, o rastreamento tem de ser feito já na primeira consulta do pré-natal com testes não treponêmicos, seguidos de confirmação com testes treponêmicos.
Interpretação das sorologias para sífilis
Em gestantes
Fonte: Portaria CCD-25, Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, 18/7/2011
Vale lembrar que doenças autoimunes, infecções crônicas e gestação configuram também causas de falsa-positividade em VDRL ou RPR.
Uretrites
Embora as uretrites possam ter causas não infecciosas, a etiologia mais frequente dessa condição é mesmo a infecção por Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis. Além disso, agentes como Ureaplasma urealyticum/parvum, Mycoplasma genitalium e Trichomonas vaginalis podem estar implicados em tais quadros.
O achado de diplococos gram-negativos intracelulares (DGNI) no exame bacterioscópico da secreção uretral indica a presença de N. gonorrhoeae, que muitas vezes se acompanha da infecção por C. trachomatis. As uretrites não gonocócicas – cuja bacterioscopia é negativa para DGNI – são causadas por clamídia em 15% a 40% dos casos.
Para o diagnóstico das uretrites causadas por clamídia e gonococo, a PCR é o método com maiores sensibilidade e especificidade, de preferência em urina de primeiro jato, que tem coleta menos invasiva e desconfortável que a da secreção uretral, sem perda de sensibilidade.
Ainda assim, a realização da cultura para N. gonorrhoeae em meio de Thayer-Martin e do antibiograma mostra-se de grande importância nesse contexto, dadas as elevadas taxas de resistência antimicrobiana dessa espécie na cidade de São Paulo.
Já para a pesquisa de M. hominis e U. urealyticum/parvum, os testes moleculares não apresentam boa relação custo-benefício, pois há necessidade de uma avaliação quantitativa para a confirmação diagnóstica. Consideram-se significativas contagens =104 UTC/mL.
Treponema pallidum mostrado por microscopia eletrônica de varredura.
Science Source/Photoresearchers/Latinstock
Vaginites e endocervicites
Nas mulheres, com frequência os agentes comumente relacionados com as uretrites em homens dão origem a vaginites e endocervicites. Estas últimas, vale ressaltar, podem ser assintomáticas em 70% da população feminina ou cursar sem corrimento vaginal, mas com disúria, dispareunia e desconforto pélvico.
O exame bacterioscópico simultâneo das secreções vaginal e cervical mostra-se útil para o diagnóstico diferencial das cervicites por N. gonorrhoeae e C. trachomatis com outras causas de corrimento vaginal. A visualização de DGNI na secreção endocervical é específica para a infecção por gonococo, mas pouco sensível (em torno de 50%). A sensibilidade da microscopia para a pesquisa de tricomonas varia entre 50% e 70%.
O método de escolha para a investigação específica das infecções por N. gonorrhoeae e C. trachomatis é a PCR no raspado endocervical, mais sensível do que a executada na secreção vaginal. A cultura desta, a propósito, ajuda a nortear a escolha terapêutica para gonorreia e a diagnosticar candidose. Por fim, a cultura específica para tricomonas possui sensibilidade de 80% e é o padrão-ouro para esse diagnóstico.
Microscopia eletrônica de transmissão aponta exemplares da Chlamydia trachomatis
SPL DC/Latinstock
Rastreamento da Chlamydia trachomatis
Todas as mulheres sexualmente ativas com idade =25 anos devem ser rastreadas para a clamídia, da mesma forma que as mais velhas com fatores de risco. Os testes moleculares no raspado endocervical mostram-se mais sensíveis que os ensaios de fluorescência direta.
A sorologia apresenta valor limitado nesse contexto. A positividade em uma amostra isolada não confirma processo infeccioso ativo, uma vez que infecções prévias por C. trachomatis podem deixar níveis séricos de anticorpos elevados e ainda existe a possibilidade de ocorrerem reações cruzadas com outras espécies de clamídia. Assim, o diagnóstico de infecção recente depende de aumento significativo de IgA e/ou IgM e IgG (ao menos dois títulos) entre uma amostra coletada na fase aguda e outra na convalescente. Na prática, a sorologia deve ser reservada para o diagnóstico de linfogranuloma venéreo e de salpingites, em que os títulos de IgG são frequentemente elevados, bem como para investigações de infertilidade e gravidez ectópica.
As manifestações provocadas pelo vírus Herpes simplex (HSV) são bastante típicas, permitindo muitas vezes o diagnóstico clínico. Trata-se de múltiplas pequenas lesões vesiculares intensamente dolorosas, que aparecem na vulva, agrupadas sobre base eritematosa, rompendo-se a seguir e tornando-se exulcerações capazes de coalescer em uma úlcera maior. O agente principal é o HSV-2, embora o HSV-1 também possa estar envolvido. Ambos se caracterizam por reativações de frequência variável, causando lesões recorrentes.
Os exames laboratoriais são recomendados quando a lesão tem aspecto atípico e na diferenciação entre o HSV-1 e o HSV-2. O método mais sensível é a PCR. Os resultados negativos, porém, não excluem o diagnóstico, mesmo em um teste molecular, uma vez que a eliminação viral é intermitente e a sensibilidade da técnica depende da qualidade do material celular obtido na coleta. A análise citológica em busca de inclusões virais nas células epiteliais corrobora o diagnóstico, embora com baixas sensibilidade e especificidade.
A sorologia possui utilidade limitada, uma vez que os anticorpos podem demorar semanas para surgir após a primoinfecção e persistem positivos (IgG) por tempo indeterminado, não sendo recomendada para rastreamento.
Partículas do vírus Herpes simplex evidenciadas por microscopia eletrônica de transmissão.
SPL DC/Latinstock
Indicações da sorologia anti-HSV
Assessoria Médica |
---|
Biologia Molecular e Ginecologia Dr. Gustavo Arantes Rosa Maciel [email protected] Dr. Ismael Silva [email protected] Infectologia Dra. Carolina S. Lázari [email protected] Dr. Celso F. H. Granato [email protected] Dr. Jorge L. M. Sampaio [email protected] |
Dados da OMS de 2022 revelam que há cerca de 254 milhões de portadores de hepatite B no mundo.
Avaliação complementar da análise histológica convencional de lesões pré-neoplásicas e neoplásicas.
Pode ser utilizada para detectar o DNA da bactéria Leptospira spp. no plasma.
A uveíte é uma inflamação ocular que representa uma das principais causas de morbidade ocular.