Varicocele e saúde do adolescente

Mesmo sem indicação de cirurgia, meninos com a condição devem ser acompanhados anualmente

Define-se varicocele como a dilatação das veias do plexo pampiniforme, com a presença de refluxo sanguíneo, o que se associa a múltiplos fatores, como incompetência das válvulas nas veias espermáticas internas, alteração da drenagem venosa, postura bípede e até mesmo história familiar positiva da condição (1,2). O aparecimento ocorre tipicamente na puberdade, de forma silenciosa, ocasionando sintomas de dor ou desconforto local raramente. Por ter característica oligossintomática, pode passar anos sem ser diagnosticada. De modo clássico, a varicocele é mais importante à esquerda, mas a bilateralidade ocorre com muita frequência (3,4).

A condição está por trás de até 40% dos casos de infertilidade primária masculina e de até 80% dos de infertilidade secundária (5). No adolescente, alguns autores já relataram o impacto negativo da varicocele clínica no potencial reprodutivo, influenciando tanto o volume testicular quanto a qualidade seminal. Contudo, o consenso de tratamento cirúrgico da varicocele clínica na presença de alterações da análise seminal ou de provas funcionais não se aplica àquela detectada nos adolescentes, já que a imaturidade hormonal própria dessa fase da vida pode interferir nos parâmetros usados nos homens adultos.

Diagnóstico clínico e de imagem

O diagnóstico da varicocele é realizado no próprio consultório, baseado em um exame físico cuidadoso, com o paciente em posição ortostática e o examinador sentado, sob iluminação adequada (de preferência, luz branca) e com temperatura da sala controlada entre 22oC e 25oC. No adolescente, recomenda-se o exame físico anual para a detecção de varicocele clínica e aferição do volume testicular por meio do orquidômetro de Prader, bem como a ultrassonografia de bolsa testicular para avaliação do dano testicular ou para indicação de correção cirúrgica. 

A classificação do grau de dilatação tem extrema relevância para o manejo clínico da varicocele, pois são considerados passíveis de tratamento apenas os graus II e III. Estudos mostram que as de grau I e as subclínicas, visualizadas apenas no exame ultrassonográfico, não apresentam impacto negativo de maneira isolada na espermatogênese e, portanto, não necessitam de abordagem terapêutica (6).

Classificação:

  • Grau I: dilatação do cordão espermático, palpável apenas com a manobra de Valsalva.
  • Grau II: dilatação de cordão espermático facilmente palpável com o paciente em posição ortostática, demonstrando acentuado enchimento venoso durante a manobra de Valsalva.
  • Grau III: dilatação volumosa do cordão espermático facilmente visualizada com o paciente em posição ortostática e ectasia intensificada durante a manobra de Valsalva (7).

O tratamento da varicocele sempre é cirúrgico, com uso do microscópio para que se possa realizar a melhor técnica. O adolescente que apresenta a forma clínica e diminuição do volume testicular, com diferença de 20% em comparação ao testículo contralateral, tem indicação para varicocelectomia (8). A correção cirúrgica está associada com recuperação quantitativa e da qualidade funcional do espermatozoide, já que se observa que tanto a integridade do DNA espermático quanto a atividade mitocondrial se restabelecem após o procedimento. Espera-se que até 80% dos adolescentes recuperem o volume testicular afetado pela condição após a varicocelectomia microcirúrgica – efeito chamado de catch-up growth.

A análise seminal, ou espermograma, é o principal exame para avaliação dos efeitos de longo prazo e progressivos da varicocele sobre a produção de espermatozoides. Pode-se observar prejuízos em todos os parâmetros seminais, como a redução da concentração espermática, a diminuição da motilidade progressiva, a queda da vitalidade e, por fim, o decréscimo do valor da morfologia. Contudo, na adolescência, a imaturidade do eixo hipotálamo-hipófise-testículo torna esse exame pouco confiável para indicar a correção cirúrgica nos casos de varicocele de graus II ou III.

Se não houver evidência objetiva de redução do volume testicular, os adolescentes com varicocele devem ser seguidos anualmente com medida do tamanho dos testículos e/ou análise seminal para detectar sinais iniciais de prejuízo testicular relacionado com a condição (8).

Saúde do adolescente masculino

O urologista responde pela saúde do homem em todas as idades. O adolescente do sexo masculino faz parte de um segmento da população que se encontra desassistido em termos de prevenção e promoção da saúde, uma vez que não realiza consultas médicas de rotina – cerca da metade da população masculina refere não procurar um urologista regularmente.

Diferentemente do que acontece com as mulheres, que já começam a frequentar o consultório do ginecologista desde o início da puberdade, os homens têm, como hábito, perceber a necessidade de consultar o urologista de maneira rotineira apenas aos 45 a 50 anos, na época de iniciar a avaliação de doenças relacionadas à próstata.

Um estudo feito pelo Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC) norte-americano mostrou que cerca de 80% das consultas ao ginecologista são feitas por mulheres de 15 a 44 anos, das quais 20% têm menos de 24 anos de idade, e 71% procuram o médico para a prevenção de doenças. Para efeito de comparação, apenas 16% dos homens de 15 a 44 anos consultam um urologista, dos quais 4% têm menos de 24 anos, e somente 8% com o objetivo de cuidar da saúde de forma preventiva.

A falta de atenção à saúde do jovem pode acarretar, no futuro, um homem maduro sem a cultura e a educação de consultar o médico de forma habitual e rotineira, que busca auxílio profissional apenas na presença de alguma doença urológica. Por isso, a conscientização da população sobre a importância de os adolescentes começarem a realizar consultas de rotina com o urologista deve ser estimulada.  

Além da possibilidade de detectar doenças que podem surgir ou se tornar aparentes na adolescência, como varicocele, fimose e balanopostite, o urologista pode orientar os meninos sobre as diversas dúvidas relacionadas ao aparelho reprodutivo e às transformações que apresentam com a idade, assim como os riscos de infecções sexualmente transmissíveis e de gravidez indesejada com o início da vida sexual. A consulta também é importante para identificar comportamentos de risco, abordar questões diversas da saúde, realizar a promoção de saúde global e evitar acidentes, comuns nessa fase da vida.

 

Referências bibliográficas

1. Ahlberg NE, Bartley O, Chidekel N. Right and left gonadal veins. An anatomical and statistical study. Acta Radiol Diagn (Stockh). 1966 Nov;4(6):593-601.

2. Gokce A, Davarcy M, Yalcynkaya FR, Guven EO, Kaya YS, Helvacy MR, et al. Hereditary Behavior of Varicocele. J Androl. 2009 Oct 15.

3. Gat Y, Bachar GN, Zukerman Z, Belenky A, Gornish M. Varicocele: a bilateral disease. Fertil Steril. 2004 Feb;81(2):424-9.

4. Kass EJ, Reitelman C. Adolescent varicocele. Urol Clin North Am. 1995 Feb;22(1):151-9.

5. American Society for Reproductive Medicine and Society for Male Reproduction and Urology. Report on varicocele and infertility. Fertil Steril. 2008 Nov;90(5 Suppl):S247-9.

6. Mori MM, Bertolla RP, Fraietta R, Ortiz V, Cedenho AP. Does varicocele grade determine extent of alteration to spermatogenesis in adolescents? Fertil Steril. 2008 Nov;90(5):1769-73.

7. Dubin L, Amelar RD. Varicocele size and results of varicocelectomy in selected subfertile men with varicocele. Fertil Steril. 1970 Aug;21(8):606-9.

8. American Society for Reproductive Medicine and Society for Male Reproduction and Urology. Report on varicocele and infertility: a committee opinion. Fertil Steril. 2014;102:1556-60.

 

CONSULTORIA MÉDICA

Dr. Daniel Suslik Zylbersztejn

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